Aí está a cimeira de Copenhagen em todo o seu esplendor mediático, com toda a pompa de declarações e intenções, com as suas cortes e circos. Subitamente, toda a gente tem algo a dizer sobre o evento. Aliás, ciclicamente, o tema do Ambiente é objecto de mágicos alertas que têm o condão de pôr combóios de boa gente a falar dele tanto e tão bem como antes terão falado de futebol, de escutas, de filas de espera, do último modelo de telemóvel, ou de chouriços. Ou ainda da alegada fuga de emails denegrindo ditos cientistas que terão manipulado dados sobre as famigeradas alterações climáticas e o não menos famigerado aquecimento global, visando, no essencial, desacreditar, menosprezar e achincalhar o movimento ambientalista em geral.
No meio de todo o ruído, não percebo tamanha surpresa e admiração perante dados de que há muito se falava. Por exemplo, entre Julho de 2006 e Novembro de 2009, a negociata, a fraude, o embuste do comércio de emissões mereceu, pelo menos, 16 referências no Ondas3. Mas como o Ondas3, blogue de informação e reflexão sobre temas ambientais desde Janeiro de 2004, ainda não é blogue de referência, isto é, não é citado pelos media de referência, as dicas e comentários aqui disponibilizados terão passado despercebidos.
Para memória futura e para eventual ajuda dos tais media de referência, dos distraídos e ainda dos que, tranquilamente, vão tirando mestrados e doutoramentos na área do Ambiente, aqui reuno as dicas e comentários feitos pelo Ondas3 entre Julho de 2006 e Novembro de 2009 (uma em 2006, cinco em 2007, três em 2008 e sete em 2009):
- 1. 18Julho2006: 5 anos após a Europa lançar o comércio de emissões como meio de salvar o planeta, conclui-se que estamos a falhar os objectivos. Em vez de ter reduzido as emissões de dióxido de carbono, o sistema fez aumentar os preços da electricidade em mais de 50% e quem ganhou com isso foram empresas como a RWE AG.
- 2. 5Mar2007: O actual sistema de comércio de emissões não passa de um jogo de blefe que permite que os poluidores do mundo rico passem a responsabilidade da redução das emissões para as fábricas do mundo pobre.
- 3. 13Mar2007: A primeira vaga do mercado de carbono foi formada por empresas que viram nas oportunidades de créditos de carbono uma oportunidade de fazer dinheiro. A segunda vaga está a começar. É formada por empresas preocupadas em dar uma imagem verde de si.
- 4. 15Jun2007: O mecanismo do comércio de emissões está condenado a falhar, diz a WWF. Tudo porque na primeira fase permitiram que as empresas que reduzissem as suas emissões recebessem créditos extra para vender e ganhar dinheiro.
- 5. 19Jun2007: As empresas de energia fizeram grandes lucros à custa dos consumidores e à pala do esquema do comércio de emissões, admite o governo britânico.
- 6. 3Dez2007: O comércio de emissões está a ser invadido por centenas de projectos que vão aumentar significativamente o volume de emissões para a a atmosfera, denuncia a International Rivers em relatório intitulado Failed Mechanism. As empresas hidroeléctricas podem ganhar uma pipa de massa vendendo créditos de carbono falsos a empresas e governos que os podem usar para justificar um aumento nas suas emissões.
- 7. 27Mai2008: Biliões de libras estão a ser desperdiçadas a pagar a indústrias de países em vias de desenvolvimento para reduzirem as emissões de gases de efeito de estufa, dizem estudos recentes. O fundo de compensações das NU está a ser mal utilizado, havendo muitas empresas que reclamam créditos de redução de emissões para projectos que não mereciam creditação. Por isso não se verifica redução de emissões a sério.
- 8. 15Julho2008: As Nações Unidas dizem que vão tomar medidas para acabar com o caos que reina no comércio de emissões, vulgo negócio do carbono. Tudo porque as agências que operam nesta espécie de bolsa de valores do carbono facturam sobre projectos que são subsidiados mas que não promovem a qualidade do ambiente.
- 9. 13Dez2008: Angela Merkel só adopta políticas verdes se não atingirem as grandes indústrias, escreve George Monbiot em artigo agora publicado no Guardian. Pontos a reter: (2) os países pobres que já venderam créditos fáceis aos países ricos vão ter mais dificuldades para reduzir as suas próprias emissões, o que é um autêntico colonialismo no qual a Europa apanha a fruta dos países pobres que está à mão, deixando-os com escolhas muito mais difíceis de fazer no futuro; (3) o esquema do comércio de emissões preverte a justiça ambiental porque os poluidores acabam por ganhar dinheiro alijando as licenças de poluição para os clientes; (4) os representantes europeus romperam a promessa de leiloar os créditos de emissões das indústrias poluidoras em 2020 deliberando que os poluidores só pagarão 70% dos prejuizos que fizerem e, pior ainda, as empresas receberão tudo o que investiram se provarem que estão a perder com a concorrência de empresas externas à União europeia; (5) este esquema foi todo montado por Angela Merkel, que consegiu suavizar os padrões de rigor da eficiência de combustíveis nos carros, que fez aprovar um substancial pacote de medidas para ajudar a indústria automóvel e agora apoia a isenção das cimenteiras, das químicas e do aço.
- 10. 16Fev2009: Cabo Verde deverá vender créditos de carbono a Portugal para que as indústrias portuguesas possam poluir mais sem pagar multas à Europa. Sobre este esquema de comércio de emissões considerado por alguns como forma de neo-colonislismo, convirá reler as ideais-base de um artigo de George Monbiot aqui referido, Espero que o caos detectado pelas Nações Unidas neste esquema de comércio de emissões tenha já sido resolvido, sob pena das agências que operam nesta espécie de bolsa de valores do carbono continuarem a facturar sobre projectos subsidiados que pouco ou nada contribuem para a qualidade do ambiente. A Grécia já teve problemas por causa deste negócio.
- 11. 24Fev2009: O mercado de carbono entrou em colapso. “O ano passado Bruxelas estabeleceu um limite de créditos de carbono aos maiores poluidores europeus. As indústrias que reduzissem a sua poluição poderiam vender créditos a outras que precisassem. Enquanto a procura ultrapassou estes limites e o preço dos créditos era alto, houve motivos para se investir em energia verde. Para quê comprar créditos caros para manter uma central a carvão quando se podia investir em energia limpa?” explica Julien Glover (JG) no Guardian de 23 de Fevereiro. Este comércio de emissões funciona enquanto há escassez de créditos e há especulação. Se os créditos são baratos e toda a gente tem muitos, então os incentivos verdes entram em colapso. A crise e a recessão trazem menos produção, menos poluição e, consequentemente, mais créditos a preços mais baixos e possibilidade de poluir mais. “O resultado é um sistema que não resolve nada contra as alterações climáticas mas enche os bolsos aos mega-poluidores como a produtora de aço Corus”, explica JG
- 12. 12Mar2009: James Lovelock concorda com Michael Meacher: o comércio de emissões é um esquema desastroso que não ajuda a reduzir as emissões mas apenas contribui para aumentar os lucros das grandes empresas poluidoras. “Os governos, especialmente o alemão, vergaram às pressões da indústria e atribuiram muito mais créditos do que a indústria precisava”, esclarece. Por isso o preço do carbono colapsou e a capacidade das empresas pedirem créditos para investir em projectos ditos limpos em países pobres teve como consequência nada terem feito para despoluir as suas próprias indústrias.
- 13. 25Mar2009: 20 teses contra o capitalism verde, de Tadzio Mueller e Alexis Passadakis.
- 14. 2Jun2009: A grande vigarice do negócio do carbono: porquê pagarmos ao Terceiro Mundo para poluir o seu ambiente? pergunta Nadene Ghouri em extensa reportagem publicada no Mail on Sunday de 31 de Maio.
- 15. 16Jun2009: A Australian Conservation Foundation e o Australian Climate Justice Program acusaram 6 empresas (Woodside, Xstrata, Rio Tinto, Boral, Caltex Australia e BlueScope Steel) de inflaccionarem o custo do programa de comércio de emissões para conseguirem mais apoios governamentais.
- 16. 6Nov2009: O esquema do comércio de emissões pouco ou nada tem feito para reduzir as emissões, mas tem contribuído muito para a corrupção, dizem os ambientalistas do Friends of the Earth. E o esquema até pode provocar uma crise financeira semelhante àquela que estamos a atravessar. "A maior parte do negócio é feito não entre as indústrias poluidoras e as fábricas aderentes dos esquemas do comércio de emissões mas por bancos e investidores que lucram com a especulação nos mercados de carbono", concretiza Sarah-Jayne Clifton.
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