Na envolvente de Manteigas, de entre as várias dezenas de
hectares de castinçal (e outras caducifólias) que estiveram na rota do fogo, as
perdas verificam-se diminutas, num incêndio que teve uma evolução impetuosa e
que pouco poupou à sua passagem. Na verdade, o fogo entrou em grande parte do
perímetro dos bosques de folhosas (castanheiros, faias, bétulas, carvalhos),
mas as chamas rapidamente diminuíram de intensidade, fenómeno promovido pela
capacidade que estes povoamentos têm de controlar de forma natural o
crescimento de matos, bem como por promoverem um ambiente mais húmido e fresco
no seu interior, pouco propício à inflamabilidade. Desta forma, fomentam
frequentemente uma abrupta diminuição da intensidade das chamas ou mesmo a sua
própria extinção, numa distância que por vezes se revela surpreendentemente
curta.
O que seria deste incêndio se tivesse encontrado uma área
muito mais representativa de caducifólias ao longo do seu percurso,
nomeadamente nas encostas expostas a norte, sobranceiras a Verdelhos, por onde
as chamas desceram ao vale do Zêzere? Provavelmente não se teria propagado à
face oposta da encosta, momento a partir do qual começou a assumir proporções
incontroláveis.
Se é verdade que esta não é uma solução única nem
tampouco extensível a todo o país, também é verdade que poderia estar a
produzir resultados muito relevantes numa porção considerável do território,
onde as condições edafoclimáticas permitem explorar as potencialidades dos
bosques de caducifólias enquanto retardadores da progressão do fogo. Importa
pois aliar este fator a vários outros que já têm vindo a ser apresentados
publicamente em diversas ocasiões, que não só tornem possível um ordenamento da
propriedade e da paisagem, como que permitam criar descontinuidades na
vegetação de forma responsável e sustentável, nomeadamente através da promoção
do pastoreio e do incentivo da prática agroflorestal.
Que possamos, através destas imagens (que qualquer um
pode comprovar visitando a bonita envolvente de Manteigas), absorver alguns
ensinamentos que a natureza coloca ao nosso dispor, os quais, para alguns, não
serão uma novidade, mas que, lamentavelmente, continuam a ser completamente
ignorados pelos decisores na hora de implementar uma gestão da paisagem natural
mais sensata, consciente e com visão de futuro. E urge fazê-lo, porque do que é
possível perspetivar apenas se vislumbra um irremediável agudizar deste ciclo
vicioso, o qual a minha geração vai inevitavelmente receber em mãos: um país
pronto a arder descontroladamente todos os Verões.
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