Bico calado
- «O confinamento levou-me a descobrir que temos coisas a
mais, que não nos servem para nada e coisas a menos, de que necessitamos. (…) Em
tempo de confinamento deambulamos por casa: Um mundo de inutilidades. (…) Falta
acrescentar o lixo que sai das televisões, da que estaciona no canto da sala,
na do quarto; os comentadores, os da bola, os de tudo: do clima à bomba de
hidrogénio. Os que me explicam o que acabei de ver, de ouvir. Todos, com e sem
gravata, a informarem-me que a vida é perigosa e acaba mal, que o que hoje
sobe, amanhã desce. Uma caterva de sirenes televisivas a gritar que vivemos no
caos. Esquecem-se de informar que me vendem o caos em cada anúncio de
publicidade! Descobri com o confinamento que o caos começa em minha casa. Não
preciso de um pivô (com isto da neutralidade de género já será de incluir as
pivoas?) para me avisar. O caos, construímo-lo logo na primeira mala de levar
livros à escola, cadernos, borrachas, lápis. O caos começa nos que nos rodeiam.
O caos é a ordem do mundo e ainda pago para me informarem do caos que eu criei!
Há caos nos hospitais! Obrigado. E nas redações das televisões, da rádio e dos
jornais? Aí não há caos, há estratégias de poder sob a forma de alarmes pela
nossa saúde! E nos estádios de futebol? Não há caos, há corrupção! E nos bares
e tabernas? Bebedeiras e vómitos que reproduzem as televisões! E nas escolas? E
no trânsito? E nas praias? E nas romarias? E nas peregrinações? E nos lares de
idosos? E nas creches e infantários? E nos tribunais? E nos paióis da tropa? E
nos bancos? E nos aeroportos e até nos cemitérios! E nas nossas relações?
Fazemos parte do caos. O que nos faz falta é uma qualquer indicação que nos
ajude a viver no caos sem gritar contra o caos. Faz-nos falta uma panela de
escape para evitar os ráteres que saem dos pregoeiros do caos! Falta-nos ordem
nas ordens. Ou uma ordem para descobrir uma vacina, um teste rápido, mas
seguro, à sanidade mental de alguns dirigentes que dê positivo ou negativo
antes de tomarem posse. Temo que a ressaca do confinamento seja uma sociedade
mais confinada, com mentalidades mais fechadas, com mais cabos da guarda a
gritarem por ordem, por limpezas gerais, por desinfestações sociais. Eu, contra
os fascismos anunciados, necessito de desordem, de desmascarar os ordeiros,
porque eles ladram, mordem e matam. Vivemos em estado de catástrofe do
nascimento à morte porque criámos uma civilização de caos, no paradoxo da
abundância, de excesso de coisas e carência de virtudes. (…) Temos barulho a
mais, hienas a mais, carpideiras a mais falantes e “ecrantes”. Temos coisas a
menos: serenidade, consciência individual, cooperação, tolerância, respeito,
reflexão. Humildade a menos para pensarmos o que faríamos se estivéssemos no
lugar do outro, do diretor do hospital, do médico, do enfermeiro, do delegado
de saúde, do administrador do lar, do diretor, do secretário, do ministro, do
comandante, do que abre e fecha escolas e restaurantes. (…) Devíamos saber o
que é importante. Um raio de sol pode ser suficiente. As catástrofes e o que
estamos a viver é um estado de catástrofe, devia ajudar-nos a pensar no que é
essencial para cada um de nós. Eu sinto falta de Liberdade e excesso de
Perversidade!» Carlos de Matos Gomes, Coisas a mais, ou a menos? – Medium.
- «As políticas de anúncio, de repetição de promessas que
tardam em se concretizar ou se esvaziam pelo caminho, esgotam-se sempre em
pouco tempo. Num contexto como aquele que vivemos, carregado de ruturas na vida
das pessoas, de desproteções, de sofrimento, de urgências que clamam políticas
com rigor e ação, esse esgotamento acelera-se e torna-se perigoso. São
múltiplos os casos, no plano nacional e na União Europeia, em que entre o
anúncio e a concretização se verifica um desfasamento abissal. Onde deveria
haver agilidade e rapidez há meses a passar. Onde todos deviam estar
abrangidos, não faltam exclusões. Onde precisávamos de recursos volumosos, há
mãos cheias de muito pouco. Assim, a desconfiança, a incerteza, o desespero e o
medo crescem e gera-se um quadro cada vez mais propicio ao cinismo político e à
manipulação. (…) Esta falta de agilidade em tempo real é, em parte, filha de
incertezas que hoje pairam sobre quem governa, mas acima de tudo, de uma
conceção política que sacraliza o desinvestimento e a ortodoxia orçamental.
Umas palavras de anúncio e a desmemória cultivada por certa Comunicação Social
e pelo ciclo (e circo) noticioso, não substituem uma governação com ética e
rigor, geradora de confiança.» Manuel Carvalho da Silva, Anúncio não alimenta
nem trata – JN 20fev2021.
- «(…) A democracia alemã jogou o jogo da democracia
impoluta e os nazis aproveitaram-se dessa fraqueza para se alcandorarem ao
poder, alterando então as regras para se perpetuarem nele. Ficou-se à espera do
“crime cometido” para só então se poder “democraticamente” agir. Simplesmente,
uma vez cometido o crime, já era tarde para o punir e corrigir. Quando se diz
que, só quando o CHEGA cometer um claro atentado violento (“tiros e pistolas”)
contra a democracia, se poderá ilegalizá-lo, está-se a escancarar a porta a uma
tirania. A verdade, repito, é que o
partido nazi já tinha deixado bem claro ao que vinha, e não me parece
particularmente sensato que se tenha ficado à espera de ele destruir toda a
Europa, para, finalmente, se intervir. O
Chega já deu claramente indícios de que não quer jogar o jogo da democracia e
quem não quer jogar segundo as regras do jogo não deve sentar-se à mesa de quem
joga. Pode ser que assim, como se diz, a
democracia fique ligeiramente imperfeita, mas é preferível ficar com ela
imperfeita a assistir ao seu suicídio, a bem da pureza. A perfeição não é deste mundo e eu prefiro
viver com uma democracia um bocadinho imperfeita a cair de novo na ignomínia de
um regime regido por um tiranete. (…)» Eugénio Lisboa, Banir ou não banir o
Chega. Via De rerum natura.
- «Se os militares responsáveis por torturas, assassinatos e
desaparecimentos durante a ditadura de 64 tivessem respondido por crimes de
lesa humanidade, como aconteceu na Argentina, não estaríamos hoje vendo
generais senis do Clube Militar vociferando contra a democracia.» Carlos Latuff.
- Um documento descoberto em arquivos oficiais mostra que o governo francês ignorou os pedidos do
embaixador de Ruanda em Paris para que as tropas francesas no país prendessem
ex-funcionários do regime hutu e, em vez disso, providenciou a sua fuga. O
documento, um telegrama do gabinete do então ministro dos Negócios Estrangeiros
de França, Alain Juppe, foi assinado pelo atual chefe da secreta estrangeira
francesa. Ele foi enviado depois de os líderes hutus terem chegado a um campo
de refugiados controlado pelo exército francês. Eles tentavam fugir de Ruanda
após a queda do seu regime, tendo orientado o massacre de centenas de milhares
de membros da minoria tutsi. Havia soldados da paz das Nações Unidas no país,
mas foram acusados de se manter à margem enquanto a onda de assassinatos se
desenrolou durante 100 dias. A ONU alegou que não tinha mandato para impedir as
mortes e a maioria das suas forças retirou após a morte de 10 soldados da ONU
da Bélgica. Extremadura Progressista.
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