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«O prémio que reconhece identifica as praias de excelência em 60 países está a ser criticado pela sua arbitrariedade. O promotor defende-se: "Se não quiser, não peça"
"Um dia apareceu-me na mesa uma fatura de 21 mil euros. Eu perguntei o que era e eles disseram que era o pagamento anual das Bandeiras Azuis. O problema é que nem sequer as tínhamos pedido e, por isso, recusei pagar-lhes”, conta Pilar Carbonell, diretora geral do Turismo do governo das Ilhas Baleares. Isso aconteceu em 2016 e marcou a primeira rejeição por parte de um governo regional do prestigiado sistema de praias certificadas.
Já em 2012, Rianxo (Galiza) abandonara a Bandeira Azul por discordar dos critérios de avaliação. Cinco anos depois, Rianxo garante não ter notado nenhum prejuízo. Entretanto, A Pobra do Caramiñal, Serra de Outes, Barreiros, Viveiro, O Grove, A Lanzada fizeram o mesmo.
Esta debandada coincide com o 30º aniversário das Bandeiras Azuis, prémio criado em 1985 para certificar marinas em França, e expandido em 1987 a praias e portos em toda a Europa, com o apoio da Comissão Europeia. O seu maior promotor foi José Ramón Sánchez Moro, atual presidente da ADEAC, a associação que gere as bandeiras em Espanha sob supervisão internacional da Fundação para a Educação Ambiental (FEE na sigla em Inglês), da qual Sánchez Moro foi presidente durante mais de uma década e agora avalia praias em 60 países.
"A realidade é que ninguém fora de Espanha dá valor especial a estas bandeiras, não é um selo que um turista europeu associe a excelência e nem mesmo a União Europeia o apoia", diz a Diretora Geral do Turismo das Ilhas Baleares. "Gastar 21 mil euros por ano não nos traz qualquer retorno, porque eles [a Bandeira Azul] nem sequer faz análises próprias à água, baseiam-se nas análises do nosso Ministério da Saúde. E ainda por cima para nos darem uma bandeira exigem-nos equipamentos, como passeios, casas de banho, duches e outras coisas que vão contra o que entendemos por qualidade. Não vais construir um passeio marítimo numa praia natural só para teres uma bandeira, não faz sentido."
A posição de Rianxo é semelhante: "Há mais coisas negativas do que benefícios. É um prémio que se não o tens não há problema, não é por isso que vem menos gente. E perante a mínima falha, é uma loucura, como aconteceu uma vez connosco, com um grafito que apareceu numa parede, e mandaram-nos retirar a bandeira. Isso cria uma imagem horrível, apareceres em tudo o que é comunicação social e até parece que a praia já não é segura. Não queremos essa pressão. Continuamos a ter todas as instalações em perfeito estado e respeitamos as análises de água do Ministério da Saúde como até agora” afirma Adelina Ces, vice-presidente da autarquia.
Nenhuma organização ambiental apoia o certificado da Bandeira Azul. Além disso, há muito que o criticam. "É uma marca publicitária, um produto comercial projetado para lavar a vergonha dos políticos por não terem o litoral em condições. É mais barato dar alguns milhares de euros à ADEAC e tirar uma fotografia do que investir três milhões de euros numa estação de tratamento de água ou para evitar centenas de resíduos tóxicos ", diz Fins Eirexas, secretário-executivo da Associação para a Defesa Ecológica da Galiza (Adega).
"As bandeiras azuis há muito que deixaram de ter qualquer garantia técnica, científica ou administrativa da União Europeia. Elas são promovidas por um grupo de associações privadas ligadas a empresas de turismo. A acumulação de denúncias e de fraudes levou a Comissão Europeia a retirar o apoio financeiro e a demarcar-se há nove anos, em 2008”, acrescenta.
"Se não querem as bandeiras, não as peçam. Dizem que isto é um negócio? Claro que é, é o melhor negócio para os espanhóis, que pagam, em média, 250 euros (para praia) por um prêmio apoiado pelas Nações Unidas, em vez de 2.000 ou 4.000 euros por um cartão que ninguém conhece", contrapõe Sánchez Moro, referindo-se a Q, o selo de qualidade Aenor ISO 9001 e ISO 14001 cada vez mais frequente nas praias. E desafia: "O que aconteceu na Galiza são quatro ou seis autarcas que terão os seus motivos, talvez para promoverem os seus próprios selos, ou para nos desacreditar porque perderam o deles. O caso dsas Baleares é uma questão política, apenas isso”.
É um facto que é a classe política espanhola que apoia a Bandeira Azul. Mesmo a Organização Mundial do Turismo (OMT), a agência das Nações Unidas que a associação ADEAC muitas vezes usa como prova de seu prestígio internacional, demarca-se deste prémio. "Nós não endossamos a certificação de praias de excelência. A Bandeira Azul é um aliado da OMT no nosso programa de sustentabilidade, mas não estão vinculados a este prémio", dizem fontes do organismo. "O problema com as bandeiras azuis é que elas não garantem que a praia tenha água mais limpa ou respeite mais o Ambiente. E as Bandeiras Azuis aproveitaram-se interessadamente dessa confusão. Em vez de serem honestos e explicarem que uma bandeira azul é concedida com base em equipamentos, tais como parques de estacionamento ou passeios, fizeram as pessoas acreditar que as bandeiras bandeiras são um selo ecológico”, denuncia Iván Ortuzar, dos Ecologistas en Acción.
A fuga do prestígio das Bandeiras Azuis atinge inclusive as áreas de segurança e primeiros socorros. Enquanto o resto do continente aposta em bandeiras SAFE como marca de excelência em serviço de segurança e primeiros socorros, em Espanha apenas três praias têm essa bandeira. "Há turistas estrangeiros que perguntam por essa bandeira, e acreditam que a bandeira azul é o mesmo, quando na realidade os seus requisitos de segurança são muito mais pobres", dizem fontes do setor. O exemplo está na costa da Galiza: mais de metade dos municípios costeiros têm dificuldades em encontrar nadadores salvadores, com cidades como Boiro hasteando seis bandeiras azuis nas suas praias sem nenhum socorrista, facto que a obrigaria a perder todas as suas bandeiras se se aplicassem os critérios ADEAC.»
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