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sábado, 2 de agosto de 2025

LEITURAS MARGINAIS

ROBÔS UCRANIANOS QUEREM QUE A BBC APOIE CRIMES DE GUERRA
por Ian Proud, Substack.



Em 18 de julho, publiquei um post no X em resposta a uma reportagem da BBC intitulada "Kill Russians, win points: is Ukraine's new drone scheme gamifying war? (Matar russos e ganhar pontos: o novo esquema de drones da Ucrânia está a transformar a guerra num jogo?)

Esta publicação deu origem a uma reação espetacularmente negativa por parte da comunidade de robôs ucranianos.

A reportagem da BBC explorava um esquema militar ucraniano em que os seus soldados podiam reclamar pontos por mortes efetuadas por drones de visão na primeira pessoa e usar esses pontos para comprar a tecnologia militar preferida numa "Amazónia para a guerra".

Embora Paul Adams, o correspondente diplomático da BBC, aborde brevemente os desafios morais que este esquema apresenta, ficou claramente impressionado. ‘O sistema de pontos eletrónicos é típico da forma como a Ucrânia tem combatido esta guerra: pensamento criativo e inovador concebido para tirar o máximo partido das capacidades inovadoras do país e minimizar o efeito da sua desvantagem numérica. Pontos por mortes. A Amazónia pela guerra. Para alguns ouvidos, tudo isto pode parecer brutal, até insensível. Mas isto é uma guerra e a Ucrânia está determinada a aguentar-se. Lutando da forma mais eficaz e eficiente possível’.

Todos os dias, militares de ambos os lados do conflito são mortos por drones e outras tecnologias militares. É por isso que tenho apelado sistematicamente a que se ponha fim à guerra na Ucrânia através de meios diplomáticos e é por isso que continuo a fazê-lo. O problema que tive com o artigo foi o facto de o título - sobre a morte de soldados russos com recurso a drones - ser acompanhado por uma fotografia de um soldado (presume-se que russo) de costas para o ecrã, com as mãos no ar, sugerindo rendição. Achei esta justaposição, nos media estatais britânicos, profundamente preocupante. A combinação do título e da fotografia poderia facilmente dar a impressão de que o destino do soldado era a morte. E se assim fosse, isso constituiria um crime de guerra. Segundo o Estatuto do Tribunal Penal Internacional, ‘matar ou ferir um combatente que, tendo deposto as armas ou não tendo mais meios de defesa, se tenha rendido à vontade’ é um crime de guerra em conflitos armados internacionais. Não se pode saber o destino do soldado, se foi morto ou feito prisioneiro. O artigo refere ainda que os soldados ucranianos podem reclamar mais pontos por encorajarem um soldado russo a render-se, mas não explica como é que isso seria possível com um drone armado.

Os media ocidentais costumam produzir manchetes de ‘clickbait’, numa tentativa de manter o apetite público cada vez menor por uma guerra que a Ucrânia está a perder e que a Europa está a financiar com enormes despesas. No entanto, abre-se um precedente perigoso se o organismo de radiodifusão estatal do Reino Unido estiver a produzir artigos que inferem que estão a ocorrer crimes de guerra e que implicitamente apoiam os meios para que isso aconteça. Por isso, incluí no meu post uma sondagem que pedia às pessoas que votassem: ‘Deseja que a BBC, através das suas reportagens, apoie implicitamente os crimes de guerra e mostre imagens que aparentam ou dão a impressão das circunstâncias que levaram à ocorrência de um crime de guerra?’

O meu post obteve 20.000 votos em três dias e mais de 90% dos que votaram responderam "não", sublinhando que era errado pretender apoiar crimes de guerra nas reportagens dos media. Como não mencionei um país específico, algumas pessoas argumentaram que a alegação também poderia ser feita à reportagem da BBC sobre as atrocidades das FDI em Gaza.

Em 21 de julho, o meu post foi alvo de bots obviamente ucranianos que lançaram todo o tipo de insultos contra mim, de tal forma que passei várias horas a bloquear e a denunciar conteúdos ofensivos no meu feed. Em pouco tempo, a minha conta foi inundada por uma tempestade de insultos e falsas acusações, incluindo a de ser um ativo do KGB (sic!), de ser um apologista de Putin, de chupar pilas russas e de ser um pedófilo que usa prostitutas russas adolescentes. Adicionaram-me a ‘listas’ de ódio que os membros do X mantêm, tais como ‘cobardes nazis prostitutas’ e ‘vatniks’ (propagandistas russos). Tudo muito irritante e com o objetivo de me desacreditar publicamente. (...)

Muitos fizeram comentários generalizados sobre o facto de qualquer soldado russo na Ucrânia merecer tal destino (morrer ao render-se) e assim por diante. No entanto, este não foi o aspeto mais sinistro da reação ao meu post. Para além de votar que a BBC não deveria apoiar implicitamente os crimes de guerra, a outra opção era votar em: ‘Por favor, apoie os crimes de guerra’. 353 pessoas votaram na sondagem antes de eu ter fechado o meu post aos comentários do público. 213 pessoas votaram a favor do facto de a BBC apoiar os crimes de guerra através das suas reportagens sobre a Ucrânia. É isso mesmo, pouco mais de 60% dos eleitores, que se presume serem maioritariamente ucranianos ou apoiantes da Ucrânia, aprovam que a BBC apoie crimes de guerra, neste caso cometidos pela Ucrânia.

É aqui que reside a verdade central desta e de todas as guerras: o facto de gerarem um ódio intenso pelo outro. Esse ódio alimenta a sede de sangue que leva a crimes de guerra em qualquer teatro de conflito. Nenhuma guerra está isenta de crimes de guerra. Está documentado que militares britânicos, franceses, americanos, russos e ucranianos, cometeram crimes de guerra, juntamente com os de muitos outros países. A guerra reduz a humanidade às mais negras profundezas da depravação, em que os atos mais inconscientes são justificados com base na derrota do outro odiado. Perdoem-me por acreditar que a BBC não deveria estar a glorificar isso, mesmo que implicitamente, ou a encorajar outros a fazê-lo. Preferia muito mais que estivessem a promover uma solução negociada para esta terrível guerra.

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