Emanuele Mulas, Officina Progetti.
Algumas palavras desaparecem silenciosamente. Não porque as pessoas deixem de as usar, mas porque são substituídas, suavizadas e despojadas do seu impacto. Isto acontece em todo o lado: na política, na economia e nos meios de comunicação social.
Já não se fala de precariedade, mas de flexibilidade laboral. A guerra é rebatizada de missão de paz. Já não se defendem os direitos coletivos, mas promove-se a meritocracia inclusiva. E quando os serviços sociais são cortados, chamamos-lhe reforma da segurança social.
"São só palavras", poder-se-ia pensar. Mas as palavras moldam o pensamento. Se um problema deixa de ter um nome claro, torna-se mais difícil reconhecê-lo, discuti-lo e lutar contra ele. Não é por acaso que os termos vagos e genéricos nos confundem, impedindo-nos de compreender a verdadeira natureza do discurso e afogando-nos em infinitas nuances e contradições.
Se o termo "luta de classes" deixa de ser utilizado por ser considerado demasiado ideológico, então a desigualdade parece pertencer ao passado. Quando deixamos de falar de exploração e passamos a falar de otimização dos processos, a desigualdade entre patrões e trabalhadores torna-se invisível, mais difícil de criticar ou reformar.
Os movimentos de extrema-direita dominam a arte de manipular a linguagem para legitimar as suas ideologias extremistas, substituindo palavras que evocam exclusão ou intolerância por expressões que soam mais aceitáveis ou mesmo positivas. Por exemplo, o nacionalismo é substituído por soberania, a xenofobia é rebatizada como defesa da identidade cultural e o racismo é disfarçado de luta contra a invasão. Estas mudanças linguísticas permitem que a intolerância seja mascarada como uma defesa legítima da tradição e dos valores nacionais.
O patriotismo e a defesa da família tradicional tornam-se instrumentos de oposição aos direitos civis, enquanto a ordem pública substitui a repressão e a segurança é usada para justificar políticas autoritárias. Este jogo de palavras torna mais difícil desafiar estas posições sem parecer que se está a opor à "defesa dos valores" ou ao "bem comum".
George Orwell, no seu famoso romance 1984, compreendeu um conceito fundamental: controlar a linguagem significa controlar a realidade. No seu mundo distópico, Orwell introduziu uma linguagem artificial, a "Novilíngua", numa sociedade dominada por regimes totalitários que dividem o mundo em três superpotências. Estes regimes mantêm o poder através da guerra perpétua, da propaganda implacável e do controlo do pensamento, impedindo qualquer mudança social e mantendo a população sob vigilância rigorosa.
Cada governo reduz progressivamente o vocabulário, eliminando conceitos considerados perigosos e tornando impossível a formulação de ideias subversivas. Se uma palavra não existe, um pensamento não pode sequer ser concebido.
O risco na nossa realidade? Um mundo onde aceitamos o que nos dizem sem o questionar. É por isso que a lição de Orwell é simples: quando alguém muda as palavras, devemos sempre perguntar-nos o que estão a tentar fazer-nos esquecer. A linguagem é poder; está constantemente a ser reformulada. Por detrás de cada palavra de protesto alterada está uma tentativa de controlar a sociedade.
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