segunda-feira, 26 de abril de 2021

Bico calado

  • «(…) Se o caso do Vietname representou o cúmulo da fotografia antiguerra, o caso de Portugal foi um expoente maior da fotografia pró-guerra. Aliás, um mês antes do massacre em Angola, o regime deportou quase todos os jornalistas estrangeiros, confiscando os seus rolos e câmaras fotográficas, depois de acusar alguns de tentarem falsificar cenas de inimizade racial ou privilegiarem vítimas negras. Como a revista Time denuncia então, mesmo os negativos enviados por correio para evitar a censura seriam queimados pelas autoridades coloniais antes de chegarem às redacções mundo fora. Com os ataques da UPA em Março de 1961, a ordem imediata foi para fechar fronteiras e negar vistos a estrangeiros — isto é, durante os meses mais violentos da retaliação portuguesa, enquanto foi o ponto do mundo com mais mortes diárias, o território permaneceu totalmente fechado, inacessível, e o regime gozava de um monopólio total sobre a informação e exposição destes eventos. Tomemos um exemplo concreto: o premiado fotojornalista alemão da Associated Press Horst Faas, que ficaria famoso pelas fotografias que fez na guerra do Vietname, e a quem se deve a decisão de publicar a imagem de Phan Thi Kim Phuc, conhecida como a “rapariga do napalm”, de Nick Ut, aquela que tem sido, aliás, invocada nesta polémica. A diferença quanto ao seu trabalho em Angola é neste sentido expressiva, dado que regressou quase sem imagens. Tendo entrado ilegalmente na colónia portuguesa, violando o embargo a jornalistas estrangeiros, foi apanhado pelas autoridades, interrogado numa prisão com uma pistola apontada à cabeça para que admitisse ser espião da CIA e finalmente deportado. Foi a hegemonia das imagens portugueses que levou também a cadeia de televisão norte-americana NBC a lançar o seu próprio documentário sobre Angola, no qual o realizador conseguiu infiltrar-se na colónia ilegalmente, obtendo imagens tanto dos massacres contra os colonos, como também da violência desumana do trabalho forçado na sua origem e ainda das execuções sumárias e dos bombardeamentos que se seguiram. Alertado previamente, Portugal conseguiu pressionar a NBC a suspender a emissão, a incluir novas imagens de um repórter favorável ao regime colonial e a cortar todas as cenas de bombardeamentos com napalm sobre civis. (…)» Afonso Dias Ramos, Público 25abr2021.
  • «(…) De Cuba veio um dia “uma senhora alta, bonita e vistosa”. Annie Silva Pais era a filha do último director da PIDE e entrara no forte com uma credencial do Copcon. Depois da visita, pede para ser recebida pelo comandante. “Queria agradecer-me a forma como o pai, que sofria de uma doença, tinha sido tratado. E contou-me que casara com um italiano fascista. E eu pensei que sim senhor, que estava certo a filha do director da PIDE ter casado com um fascista. Mas quando ela me diz que vivia em Cuba, fiquei baralhado. E a seguir mostra-me a fotografia dela, na praia, em fato de banho, com o segundo marido, que era cubano e comunista, e o pai dela, também em calções de banho. Fiquei a saber que o Silva Pais visitava a filha em Cuba.” (…)» Silva Carvalho, director da cadeia de Peniche depois do 25abr1974, entrevistado por Carlos Cipriano no Público de 25abr2021.
  • «Democracia não é Coca-Cola, que, com o xarope produzido pelos Estados Unidos, tem o mesmo sabor em todo o mundo. O mundo ficará sem vida e sem graça se houver apenas um único modelo e uma única civilização.» Wang Yi, ministro dos Negócios Estrangeiros da China. RT.

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