Bico calado
- «(…) Sendo a ERC uma emanação especializada da Assembleia da República, o que leva parlamentares a convocarem, uma vez e duas, a direção da informação da RTP e uma das suas jornalistas para prestarem declarações sobre a guerra interna que as opõe atualmente ? Não é a ERC que deveria ocupar-se do assunto? Os parlamentares não têm suficientemente matérias para ocuparem as suas agendas? Quanto à ERC, não era ela precisamente que deveria ter tomado a iniciativa de investigar sobre o assunto e de convocar as partes em presença? Não estará a ERC a adotar demasiadamente um perfil baixo em matérias que lhe dizem diretamente respeito, correndo assim o risco de deixar de justificar a sua própria existência?» J-m Nobre-Correia, FB.
- «(…) É que quase todo o jornalismo que se faz sobre sem-abrigo se ocupa sobretudo das "histórias humanas", quer dos sem-abrigo quer das "equipas de rua", muitas vezes compostas de voluntários, e passa ao lado do resto. O resto, que é chato, mete papelada, requerimentos de RSI, propostas de habitação e projetos de vida. Implica investimento e empenhamento público para além de sandes, sopa, banhos e centros de acolhimento de emergência e é o que pode fazer a diferença entre tirar aquelas pessoas da rua ou não; é o que poderia ter evitado o que sucedeu com Sara e o bebé. Era sobre esse resto que nós, jornalistas, deveríamos ter exigido informação. Não ajudou, claro, que não soubéssemos a quem, e que a entidade com obrigação de dar essa informação se tenha invisibilizado. Não ajuda que, como tantas vezes sucede em Portugal, as instituições públicas funcionem como se não vivessem em democracia e não tivessem obrigações de transparência e prestação de contas. E não ajuda ser tarde. Mas aqui estou, atrasada mas logo que possível, a pedir contas. Sara está detida há mais de um mês, como mais de um mês de vida tem o bebé salvo do lixo. E ainda não vi, não vimos, um comunicado, um esclarecimento, qualquer coisa - de esquerda, já agora - do NPISA e da Câmara de Lisboa sobre o assunto. Não vimos um anúncio de inquérito sobre o caso, como se fosse possível algo assim acontecer e não haver uma averiguação formal, um apuramento de responsabilidades. Como se, à partida, se decidisse que não há nem pode haver responsáveis; que o que sucedeu é normal, que não havia nada a fazer e não vale a pena perder tempo com o que lá vai. Como se à partida o NPISA nos estivesse a dizer que não serve para nada, que isto da intervenção junto dos sem-abrigo é uma completa treta da qual não podemos esperar mais do que carrinhas a distribuir sopa. Como se aquele bebé no lixo fosse um gesto radical performativo, espelho brutal do nosso não querer saber.» Fernanda Câncio, in Lembra-se de Sara Furtado? – DN 14dez2019.
- Nove pessoas foram presas na Albânia por suspeita de homicídio e abuso de poder após um terremoto no mês passado que matou 51 pessoas. Construtores, engenheiros e funcionários são suspeitas de violar os regulamentos de construção que levaram ao colapso dos edifícios durante o terremoto de magnitude 6,4 em 26 de novembro, que deixou 900 feridos e 5 mil sem abrigo em Durres e Thumane, no norte de Tirana. Grassa a construção ilegal na Albânia, onde o desenvolvimento caótico explodiu após a queda do comunismo em 1990. Muitos edifícios não possuem as devidas licenças e não respeitam os códigos de segurança. AFP/Terra Daily.
1 comentário:
A PROPÓSITO DA GUERRA INTERNA NA RTP…
Entre outras passagens do meu recente livro "Teoria da Informação Jornalística" (Almedina) que tratam do assunto, deixem-me citar aqui as pp. 268-269 :
"8. O jornalismo de denúncia
Desde as revelações do Washington Post […] (em 1975) […] um autodenominado «jornalismo de investigação» fez a sua aparição nos média dos nossos países. Tomando, antes de mais, por alvo homens políticos e grandes partidos políticos, grandes instituições e grandes empresas, mundo parlamentar e mundo judiciário, o «jornalismo de investigação» é sobretudo um jornalismo de revelações, porque repousa, na maior parte das vezes, em inquéritos conduzidos por outros (meio judiciário, polícia,…) e que foram objeto de «fugas», sem que os jornalistas se interroguem sobre «o que motiva as fontes deles a darem-lhes tal ou tal informação», porquê uma tal generosidade para com os média. De facto, um «jornalismo de investigação» aparenta-se «por vezes com um exercício de delação» e cai naturalmente no que se poderia chamar, mais precisamente, um jornalismo de denúncia, espécie de arma de destruição massiva que tem por objetivo derrubar os poderosos, fazê-los cair por terra num implacável bota-abaixo, instaurando uma tirania mediática que fomenta o medo em muitos meios dirigentes. Poder-se-á desde logo considerar uma tal démarche jornalística uma contribuição para a consolidação do sistema democrático? A interrogação merece em todo o caso ser formulada.
Depois de a terem praticado, jornalistas houve que se deram conta de que «o jornalismo de investigação derivou para uma nova forma de prática, a do profeta da desgraça, do inquisidor» […]"
J-m Nobre-Correia, 16dez2019.
https://www.facebook.com/jm.nobrecorreia/posts/2535174506746343
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