Foto: Ronald Wittek/EPA
- A indústria do voluntariado solidário funciona segundo a ideologia colonialista, escreve Lynne Jones, na Aeon. Os reais destinatários da ajuda são explorados, marginalizados e, pior, os esforços para melhorar as suas próprias condições são anulados, e até mesmo bloqueados pelas ONGs que alegam estar a ajudá-los. «Durante 25 anos trabalhei como voluntária solidária para instituições que, defendendo a retórica da capacitação dos beneficiários e ouvindo as suas vozes, marginalizam, excluem e enfraquecem aqueles que querem ajudar. O esforço de ajuda após o terremoto de 2010 no Haiti é um bom exemplo de como essas estruturas funcionam. Passei seis meses no primeiro semestre de 2010 estabelecendo e executando um programa de saúde mental enquanto trabalhava para uma grande ONG internacional. Eu vivia com outros voluntários numa bela vivenda com piscina e jardim, enquanto os meus colegas haitianos viviam em tendas. A minha situação fez-me tomar consciência da semelhança entre o projeto em que estávamos envolvidos e as suas raízes imperiais. Em Império da Humanidade (2011), Michael Barnett, um historiador de assuntos humanitários, critica a minha geração de atores humanitários por não conseguir ver dois aspetos importantes e relacionados com o nosso trabalho. Em primeiro lugar, que transformamos a compaixão num símbolo de status que alimenta o sofrimento e, de facto, exige que ele exista continuamente, para que os agentes humanitários possam sentir-se bem consigo próprios. Em segundo lugar, não reconhecemos o grau em que uma ordem humanitária cada vez mais profissionalizada, centralizada e burocratizada está a enfraquecer aqueles que afirma ajudar e a reproduzir os hábitos paternalistas dos nossos antepassados imperiais: todos aqueles missionários empenhados em acabar com a escravatura e iluminar os nativos, enquanto confia no estado colonial para os proteger. Trabalhei com extraordinários profissionais haitianos - médicos, enfermeiros e psicólogos -, mas foi o meu colega ocidental ou eu que íamos às principais reuniões de coordenação. Além dos representantes do governo haitiano, pouquíssimos haitianos eram vistos nesses locais. Os grupos locais de autoajuda e associações de bairro não tinham conhecimentos, transporte ou credenciais para chegar à sede local da ONU. Sacerdotes, pastores e herboristas, a quem a grande maioria dos haitianos recorria para pedir ajuda, não eram convidados. Em julho, cerca de 60 ONGs elegeram uma comissão para garantir uma melhor coordenação, mas nenhuma agência haitiana foi incluída. Em Moçambique, em 2013, trabalhei para uma agência na qual os voluntários solidários, bem pagos, se dirigiam a aldeias remotas para pedir aos agricultores pobres que disponibilizassem gratuitamente e oferecessem o seu tempo, também gratuitamente, para gerirem infantários. Quando sugeri pedir financiamento ao Banco Mundial para salários locais, responderam-me que isso era insustentável, embora, aparentemente, esse não fosse um problema para a complexa burocracia de ONGs e funcionários do governo que administravam a ajuda. Na Grécia, em 2016, colaborei com um pequeno grupo auto-organizado de refugiados que queria fornecer serviços psicossociais às famílias de um acampamento. Testemunhei que a ONG internacional encarregada do acampamento fazia todos os possíveis para os marginalizar e enfraquecer, rasgando os seus cartazes feitos à mão, proibindo que usassem jaquetas com um logotipo, impondo uma ONG internacional para administrar a escola que eles tinham iniciado. No entanto, era o grupo de refugiados que organizava voluntariamente as limpezas regulares de lixo e os espaços de convivência comunitários que desanuviaram os conflitos interétnicos que ocorriam noutros campos; era a este grupo de refugiados que recorriam as mulheres que precisavam de proteção à noite. A equipa internacional não estava disponível, tinha ido dormir para o conforto das suas casas. Se levamos a sério a não exploração dos mais vulneráveis, temos que os capacitar. Não se trata apenas de trabalhar em colaboração com os homólogos do governo, mas de dar poder diretamente aos mais afetados. Que tal desenvolver mecanismos para colocar todo esse dinheiro de ajuda diretamente nas mãos das vítimas e deixá-las decidir exatamente como deve ser gasto? Eles não mais precisarão se vender a si mesmos ou os seus filhos…»
- «(…) O projecto «Joãozinho», lançado em 2009 pelo então Presidente do Conselho de Administração (CA) do Hospital S. João, Prof. António Ferreira, (…) começou a angariar fundos mobilizando figuras públicas e anúncios na TV. O projecto passou a associação em 2014, tendo sido convidado pelo CA do S. João para a sua presidência o economista e conhecido especulador financeiro, Pedro Arroja. No entanto, ao fim desses cinco anos, as dádivas totalizavam perto de um milhão de euros, verba claramente insuficiente para financiar os custos da nova construção avaliados em 25 milhões de euros. Pedro Arroja (…) reuniu com o Presidente do CA do Hospital S. João e com o CEO do Continente, engenheiro Luís Moutinho, e todos acordaram um espantoso negócio já bastante distanciado da desinteressada caridade: o Continente fazia um supermercado num terreno, junto à nova ala pediátrica, «gratuitamente» cedido durante 50 anos pelo hospital, contribuindo em troca com cerca de 15 milhões ao longo desses 50 anos (300 mil por ano). O Estado, pelo seu lado, aprovaria uma lei para isentar o projecto da totalidade do IVA (5 milhões). Assim se faria o novo edifício sem que fosse necessário «um cêntimo de dinheiro público», nas palavras de Pedro Arroja, convenientemente esquecido da «dádiva» do terreno do hospital (que apenas estava concedido à «Joãozinho» por três anos), e dos cinco milhões de IVA que deixariam de entrar nos cofres do Estado. (…) com o apoio do CA do Hospital S. João mas sem o dinheiro nem as licenças necessárias, o homem decidiu começar de imediato as obras. Dessa forma, com pompa e circunstância, em Março de 2015, o então Primeiro-Ministro Passos Coelho lançou a primeira pedra da nova ala pediátrica, dando início a demolições preparatórias que acabaram por ser suspensas em Dezembro de 2015 e definitivamente paradas pela actual administração do S. João em Março de 2016, considerando o «desfasamento entre as verbas angariadas e o orçamento total da obra». E assim tudo acabou num imbróglio sem se perceber o que vai acontecer (ou o que aconteceu) ao dinheiro dos dadores, enquanto a Pediatria do S. João continua «provisoriamente» (mal) instalada em pré-fabricados, e «revoltado» Pedro Arroja diz que vai fazer queixa ao Presidente Marcelo. Este delirante processo e o convite que a antiga administração do hospital fez a Pedro Arroja para presidir ao «Joãozinho», levantam as maiores interrogações sobre a credibilidade e motivação de toda esta gente em verdadeiramente beneficiar as crianças doentes. Porque bastava conhecer a entrevista dada pelo presidente da «Joãozinho» à jornalista Fernanda Câncio, numa Grande Reportagem no início dos anos 90 (referida no jornal i de 9-12-2015), para se ficar a saber que o homem – para além de algumas brilhantes reflexões humanistas como considerar que os pretos trabalham menos porque gostam muito de sexo e achar que se devia poder vender o voto, «poderá vendê-lo a alguém que queira votar várias vezes. Já viu quantos pobrezinhos ficavam beneficiados?» – tem a admirável sensibilidade de defender o fim da legislação que impede o trabalho infantil e institui o ensino obrigatório, porque "se a criança vai ou não trabalhar, é com os pais". E para quem se afirma preocupado com as crianças, está tudo dito (…).» Jorge Seabra, in Fundações – caridade e hipocrisia à nossa custa? - Abril Abril.
- O Irão decidiu abandonar o dólar como moeda de referência de negócios internacionais e adotar o euro, conta a Reuters.
- Trump quer Gina Haspel para diretora da CIA. GH foi responsável pelo famigerado programa de tortura por água depois do 11 de setembro, tendo ordenado a destruição de 92 gravações dessas torturas em 2005. AP.
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