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Bombas no nosso quintal
In ProPublica.
Tradução livre de uma reportagem coordenada por Abrahm Lustgarten e que contou com a colaboração de Nina Hedevang, Razi Syed, Clare Victoria Church, Alex Gonzalez, Lauren Gurley, Alessandra Freitas e Eli Kurland.
Há dois anos, o exército norte-americano viu-se a braços com um enorme embaraço: um arsenal de explosivos velhos rebentou numa antiga fábrica de munições do Exército em Minden, Louisiana, levantando uma nuvem de detritos a mais de 2 mil metros de altura.
Os vizinhos, alarmados por causa dos contaminantes tóxicos despoletados pelo acidente, ficaram furiosos ao saber que os militares pretendiam queimar, ali mesmo, a céu aberto, 8 mil milhões de quilos de explosivos antigos que ainda estavam no depósito.
Perante o tumulto, o Exército recorreu à Clean Harbors, uma empresa privada que colabora há décadas com o ministério da Defesa e é uma das maiores manipuladoras de resíduos perigosos nos EUA, estando autorizada a queimar resíduos de explosivos e munições sem quaisquer controlos de emissões.
Foi assim que se instalou um incinerador e se queimou, logo em 2015, cerca de 318 mil quilos de munições, tornando a vida dos moradores um autêntico inferno.
Durante muitos anos os explosivos e as munições do exército eram destruídas nos sítios onde estavam destinadas para uso. Porém, as regras foram-se tornando mais rigorosas e as comunidades cada vez mais exigentes para com a qualidade do Ambiente. A Clean Harbor, sedeada em Massachusetts, tornou possível aquilo que estava a ser cada vez mais difícil noutros lados. Por isso ela recebe explosivos e munições de, pelo menos, 42 quartéis de 22 estados.
Apesar de todos alertarem para a alta perigosidade do material, o facto é que milhares de toneladas dele são transportadas para aqui para serem queimadas: combustível de foguete de uma fábrica de mísseis perto de Los Angeles; granadas de mão de uma fábrica de munições em Arkansas; cordões detonantes de Cincinnati, propelente sólido a partir de uma fábrica de Aerojet Rocketdyne na Virgínia, chumbo explosivo de uma fábrica de aviões militares do estado da Carolina do Norte, foguetes de ogivas da fábrica da Lockheed Martin, no Alabama.
As queimadas acontecem todos os dias várias vezes, e quando elas acontecem, transformam partes de Colfax em espécie de zonas de guerra.
Em novembro, análises oficiais feitas ao ar revelaram altas concentrações de acroleína, um vapor altamente tóxico normalmente associado à queima de munições. A acroleína carateriza-se pelo seu odor sufocante e é responsável por graves problemas respiratórios e ataques cardíacos - mesmo em doses baixas e com efeitos visíveis até 18 meses após exposição a ela.
Os relatórios de laboratório também mostraram baixos níveis de outros compostos orgânicos voláteis, nomeadamente o benzeno, conhecido por causar cancro.
Análises a água subterrânea revelaram perclorato, um tipo de combustível de foguete, com níveis 18 vezes superiores aos legalmente estabelecidos pela Louisiana e 8 vezes superiores aos estabelecidos na Califórnia. Foram também detetados RDX e HMX , ambos compostos explosivos militares, com níveis 3 vezes superiores aos legalmente estabelecidos, e níveis de chumbo 4 vezes superiores aos legalmente permitidos. Inspeções posteriores detetaram uma série de violações nomeadamente de regras de manipulação de resíduos perigosos, carência de manutenção e despejo de poluentes não autorizados.
Os técnicos de saúde do estado consideraram tudo isto inócuo para a saúde dos moradores. Estes provam o contrário: muitos sofrem de infeções pulmonares, de problemas cardíacos, de complicações de tiroide e cancro.
Em 2016, Terry Brown, representante independente do estado da Louisiana, tentou avançar com uma lei para proibir a queima a céu aberto de resíduos perigosos. O apoio da esmagadora maioria foi impotente perante a pressão da indústria que, através de baterias de advogados e profissionais de relações públicas, eliminaram a ideia.
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Relacionado: Lista parcial de sítios, nos EUA, onde foram queimadas/detonadas munições e explosivos velhos, só em 2016...
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