quarta-feira, 11 de setembro de 2024

LEITURAS À MARGEM

White Trash - A história não contada de 400 anos de classes na América (16)

“[Andrew] Jackson não foi o único cidadão do Tennesse a tornar-se uma celebridade nacional. Embora na década de 1830 viesse a ser conhecido como caçador de ursos e ‘Leão do Oeste’, David Crockett foi batedor e tenente da milícia, juiz de paz, comissário municipal, deputado estadual e, finalmente, congressista dos EUA. Foi eleito pela primeira vez para a Câmara dos Representantes em 1827. O que torna o histórico David Crockett interessante é o facto de ter sido autodidata, de ter vivido da terra e de se ter tornado um fervoroso defensor dos direitos dos ocupas - pois ele próprio tinha sido um ocupa. Como político, defendeu a causa dos pobres sem terra. (...)

Como esse tipo particular de americano, o adorável proscrito, Crockett adquiriu a reputação de inventar histórias ultrajantes. Num discurso que terá proferido no Congresso (mas que provavelmente nunca proferiu com estas palavras exatas), intitulou-se ‘a criatura mais selvagem que alguma vez se viu’. Dotado de poderes sobre-humanos, podia ‘correr como uma raposa, nadar como uma enguia, gritar como um índio’ e ‘engolir um preto inteiro’ - um comentário absurdo e racista que provavelmente pretendia transmitir a sua hostilidade para com os grandes proprietários de escravos que expulsavam os pobres ocupas das suas terras.

O verdadeiro Crockett possuía ele próprio escravos, mas no Congresso opôs-se à apropriação de vastas extensões de terra por parte dos grandes proprietários. Defendeu um projeto de lei que permitiria a venda de terras diretamente do governo federal a ocupas a preços baixos. Também se opôs à prática de os tribunais alugarem devedores insolventes para pagarem as taxas - uma variação atualizada da servidão contratada.”

Nancy Isenberg, White Trash – The 400-year untold history of class in America. Atlantic Books 2017, pp 116-117. Trad. OLima 2024.

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