“Confesso que não entendo a paixão pela dessalinização - uma solução demasiado cara e financeiramente insustentável, para combater a escassez de água e a seca. Uma central de dessalinização troca energia por água potável, e nós, além de não termos água, também não temos energia. Estamos a substituir o problema da escassez de água por outro problema, para o qual não temos resposta. A paixão pela dessalinização torna-se ainda mais incompreensível quando existe uma outra solução simples, usada por vários países, acessível e financeiramente sustentável (ou seja, com baixo custo de manutenção): o transvase, assente no reforço das bacias de retenção. (...)
O transvase de água entre bacias hidrográficas é uma solução viável para Portugal, onde os estudos indicam que se pode garantir o abastecimento de água em regiões onde a escassez é mais crítica. Os estudos do Projeto Tejo, que levam em linha de conta as alterações climáticas, concluem que o país consome atualmente apenas 8% da água disponível. Em 2100, de acordo com o mesmo estudo, esse valor será de 15%. Podemos reter uma pequena parte dessa água, sem causar grande impacto ambiental. No Norte estas previsões indicam que há excesso de água e que esse excedente poderia ser transferido para o Centro e Sul do país. A mesma fonte indica que no Sul (Alentejo e Algarve), a infraestrutura do Alqueva, baseada no rio Guadiana, resolve parte do problema, mas haverá escassez de água a longo prazo (25/30 anos), que tem de ser já endereçado. No Centro (Vale do Tejo, Oeste e Liz), uma nova estrutura semelhante a Alqueva, baseada no rio Tejo, resolveria o problema da água a longo prazo.
A maneira mais
fácil de sacar rendas ao Estado não é simplesmente extorquir dinheiro aos
cidadãos - essa solução é para amadores. A melhor maneira é construir infraestruturas que não são
necessárias ou que não são as mais eficientes, forçando sempre a
inevitabilidade de mais investimentos futuros. No caso da dessalinização há
ainda rendas garantidas associadas ao consumo de energia - há um contrato de
subscrição, um "pinga-pinga", pago pelo Orçamento do Estado.
Para complicar, a dessalinização tem algo de virtuoso ou de invencibilidade: deixamos de depender do clima e promovemos a ideia (irresponsável) de que não temos de mudar comportamentos, já que os recursos marítimos são infinitos.
Filipe Charters de Azevedo, Dinheiro Vivo.
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