quinta-feira, 20 de outubro de 2022

Bico calado

  • O discurso de abertura de Josep Borrell na inauguração do programa piloto da nova Academia Diplomática Europeia tem sido muito criticado por incluir referências consideradas racistas e neocolonialistas. Afirmou, por exemplo, que "o mundo precisa da Europa" como "farol" e belo "jardim" para civilizar a bárbara "selva" no Sul Global e até sugeriu a mudança de regime para criar uma "Rússia pós-Putin". Confirme-se com extratos da transcrição oficial desse discurso: "(...) Sim, a Europa é um jardim. Nós construímos um jardim. Tudo funciona. É a melhor combinação de liberdade política, prosperidade económica e coesão social que a humanidade foi capaz de construir - as três coisas em conjunto. E aqui, Bruges é talvez uma boa representação das coisas belas, da vida intelectual, do bem-estar. O resto do mundo (…) não é exactamente um jardim. A maior parte do resto do mundo é uma selva, e a selva pode invadir o jardim. Os jardineiros devem tomar conta dele, mas não protegerão o jardim construindo muros. Um pequeno jardim rodeado de muros altos para impedir a entrada da selva não será uma solução. Porque a selva tem uma forte capacidade de crescimento, e o muro nunca será suficientemente alto para proteger o jardim.  Os jardineiros têm de ir para a selva. Os europeus têm de estar muito mais empenhados com o resto do mundo. Caso contrário, o resto do mundo irá invadir-nos, por diferentes formas e meios. (...) E depois, há a ameaça nuclear e Putin diz que não está a fazer bluff. Bem, ele não se pode dar ao luxo de fazer bluff. E tem de ficar claro que as pessoas que apoiam a Ucrânia e a União Europeia e os Estados-Membros, e os Estados Unidos e a NATO também não estão a fazer bluff. E qualquer ataque nuclear contra a Ucrânia criará uma resposta, não uma resposta nuclear, mas uma resposta tão poderosa do lado militar que o exército russo será aniquilado, e Putin não devia estar a fazer bluff. (...) Mas, depois desta guerra, haverá um período de instabilidade e teremos de construir uma nova ordem de segurança. Como integrar a Rússia - a Rússia pós-Putin - nesta ordem mundial é algo que dará muito trabalho às pessoas a pensar na diplomacia, e em como praticá-la e implementá-la. (....) Mantenham o jardim, sejam bons jardineiros. Mas o vosso dever não será o de cuidar do jardim em si, mas sim da selva lá fora. Obrigado.» Video oficial aqui.
  • A Microsoft evita pagar impostos sobre mais de 5 mil milhões de dólares de receitas só na Austrália, ao mesmo tempo que arrecada centenas de milhões em contratos governamentais. Callum Foote, MWM.
  • Os EUA querem enviar tropas para ocupar o Haiti a fim de proteger o regime fantoche não eleito de Ariel Henry, que ajudou a liderar o golpe de estado contra o líder eleito do Haiti, Jean-Bertrand Aristide. Henry foi instalado no poder após o anterior Presidente Jovenel Moïse ter sido assassinado por mercenários colombianos que serviram como informadores para a DEA e o FBI. Liberation. Fala-se de pôr ordem no caos provocado por desacatos violentos alimentados pela grave crise social e económica que conduziu muitos à fome.

  • «A Grã-Bretanha também forneceu armas aos EUA para utilização no Vietname. Os ministros debateram em 1965-1966 se deviam impor condições gerais às exportações de armas para os EUA para utilização no Vietname e decidiram contra. Isto foi feito sabendo-se que o fornecimento de tais armas constituía uma violação dos Acordos de Genebra. Em setembro de 1965, por exemplo, o Ministério dos Negócios Estrangeiros concordou em exportar 300 bombas destinadas à força aérea norte-americana "para utilização no Vietname", dizendo que "não deve haver publicidade" e que "a entrega deve ser feita no Reino Unido". No mês anterior, o Ministro dos Negócios Estrangeiros concordara fornecer aos EUA 200 transportadores blindados Saracen para utilização no Vietname "desde que a entrega acontecesse na Europa" e não houvesse "publicidade desnecessária". Foi, de facto, desenvolvida uma estratégia específica para enganar o público. Em junho de 1965, por exemplo, o governo britânico disse aos americanos que se eles pedissem armas especificamente para uso no Vietname, a Grã-Bretanha não as poderia fornecer, mas se eles pedissem apenas as armas sem mencionar o Vietname, então a Grã-Bretanha fornecê-las-ia. Wilson disse o seguinte ao Parlamento em junho de 1967: "acreditamos que, na nossa posição de co-presidente [dos Acordos de Genebra]... não devemos enviar armas diretamente para utilização no Vietname". Esta era a posição oficial assumida no início de 1967 que permitiu que artigos "não letais" fossem exportados para os EUA. Permitia também o fornecimento de artigos letais, desde que a entrega não fosse feita antes do final de 1967, ano previsto pelos britânicos para o fim da guerra do Vietname.» Mark Curtis, Unpeople, Britains’s secret human rights abuses – Vintage 2004, pp 233-234.

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