Bico calado
- Académica de Espinho acusada de negociar terreno que já
estava vendido. Em junho de 2020, Henrique Eichmann assinou com a direção do
clube espinhense, em nome da OpulentPotential, um contrato-promessa de compra e
venda. O objetivo era construir um condomínio privado, de luxo, com a
assinatura do arquiteto Diogo Lacerda. Um ano depois, o terreno foi vendido a
outra entidade. O empresário de Esmoriz acusa o clube de só ter informado os
sócios sobre a alteração do negócio meses depois de consumar a escritura e já
avançou com pedido de indemnização. A Académica defende que quem quebrou as
condições do acordo foi Eichmann. A Académica de Espinho pretendia acordar a
venda do terreno por 1 milhão e 375 mil euros como forma de custear a renovação
e ampliação do seu pavilhão desportivo, havendo uma série de condições que
deviam ser cumpridas antes da consumação da escritura. Um desses requisitos era
a necessidade do contrato ser aprovado em Assembleia Geral do clube, que foi
concretizado no mês seguinte, a 17 de julho, iniciando-se nesse dia o prazo de
um ano para a Académica agendar a escritura, devendo o clube comunicar a
Eichmann a data e a hora da celebração do acordo com uma antecedência de, pelo
menos, 15 dias. Estipulava também no contrato a exigência de pagamento de dois
sinais antes da realização da escritura. O primeiro, de 12 mil euros, a ser
pago no prazo de três dias após a notificação da Académica sobre a aprovação do
documento em Assembleia Geral, que foi efetuado por Henrique a 5 de agosto. O
segundo sinal, com o mesmo valor, deveria ser pago no prazo de meio ano a
contar dessa data, tendo sido também realizado em janeiro de 2021, enquanto o
valor restante devia ser entregue pelo comprador no ato da escritura. Estava
definido ainda que, caso a entidade compradora não cumprisse o contrato, o
clube teria direito a "fazer seu os valores recebidos a título de
sinal". Caso fosse a Académica a não cumprir com os requisitos do
documento, a OpulentPotential teria direito a ser indemnizada com "o dobro
do valor correspondente ao sinal prestado". Outra das condições do
contrato era o reconhecimento por parte da Câmara Municipal de Espinho de uma
capacidade edificativa no terreno de, "pelo menos, 13 116 m2",
podendo a entidade compradora celebrar o contrato mesmo com a não aprovação do
parecer, tendo para tal que comunicar à entidade vendedora essa intenção. O
parecer da Câmara foi divulgado no início de 2021, tendo sido atribuído ao
terreno uma capacidade edificativa de 7 440 metros quadrados. Apesar do valor
ser inferior ao estipulado no contrato, Henrique defende que a capacidade
atribuída era suficiente para se manter interessado no negócio. "O valor
que está no contrato foi colocado por mim, para me defender. Já tinha falado
com o presidente da Académica sobre isso e ele sabia que, mesmo que fosse só
seis mil metros quadrados, estava bom para mim. Quando o parecer foi aprovado
eu pedi ao arquiteto para fazer o projeto com sete mil metros para submeter à
Câmara", garante Eichmann, referindo que não o fez de imediato devido à
proximidade das eleições autárquicas. "Aconselharam-me a não colocar logo
o projeto porque ia ficar encostado a meio de um ano de eleições", disse.
É quando o prazo para a escritura se aproxima do limite que Henrique Eichmann
começa a ficar preocupado. "Umas semanas antes do fim do prazo, o José
Lacerda liga-me para saber como estava a questão do terreno, dizendo-me que
teve uma oferta de mais 600 mil euros. Eu disse-lhe que o terreno era meu e que
não estava à venda. Até à data ele tinha tido um comportamento exemplar comigo
e fez esse pedido do nada. Fiquei com dúvidas sobre o que ele queria e o meu
advogado aconselhou-me a estar atento", afirmou. Segundo o empresário, a
partir desse dia começa a tornar-se complicado chegar à fala com o presidente
da Académica. No dia 7 de julho, Henrique decidiu enviar ao clube espinhense um
"sinal" de 351 mil euros através de duas transferências, uma de 200
mil euros e outra de 151 mil, valores que lhe foram devolvidos. Para além da
devolução do dinheiro, José Lacerda responde por email a Henrique Eichmann,
justificando a devolução do pagamento por este não estar previsto no contrato e
afirmando que ainda faltava a comunicação por parte do empresário sobre o
parecer da Câmara relativo à capacidade edificativa. Ainda nesse dia, Henrique
Eichmann responde mostrando vontade em celebrar o contrato. Na semana seguinte,
mais propriamente a 14 de julho, a Académica de Espinho apresentou a Henrique
Eichmann a resolução do contrato-promessa, fundamentando que não foi comunicada
qualquer intenção de o manter por parte deste. Por carta registada, o clube
alega que Henrique estaria a comercializar o terreno "de forma pública e
ostensiva, oferendo-o no mercado sem qualquer tipo de reserva, de tal forma que
a própria Académica veio a ser sucessivamente interpelada por diversos agentes
do mercado no sentido de obtenção de informações sobre a situação jurídica do
dito prédio e respetivo valor de venda". A missiva refere ainda um pedido
de "eventual indemnização pelos danos reputacionais entretanto causados
por vossas excelências e que a Académica liquidará em tempo devido".
Relativamente à acusação de que teria colocado o terreno à venda, Henrique
Eichmann responde que "não é verdade" e que já tinha um parceiro
definido para o negócio. "Como não tenho dinheiro para a construção
arranjei um parceiro, com a condição de o terreno pertencer à OpulentPotential.
O meu parceiro só iria entrar no negócio a seguir à escritura e não existia
qualquer proibição de eu vender uma coisa minha. Nem sequer deviam estar
preocupados com o que vou ganhar a seguir. O que eles querem é justificar o
erro deles", considerou. Sobre a acusação de não ter havido uma
comunicação sobre o parecer da capacidade edificativa do terreno, o empresário
garante que o presidente da Académica sabia do interesse dele e que havia
informações sobre a revisão do Plano Diretor Municipal que poderiam alterar o
valor desse parecer. "Hoje já é possível construir mais do que aquilo que
tinha sido aprovado e o acordado era que, mais à frente, resolveríamos esse
problema", alega. Além disso, Eichmann relembra que os 24 mil euros que
entregou a título de sinal não foram devolvidos. No dia seguinte à comunicação
da Académica, entra no Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro uma providência
cautelar levantada por Henrique Eichmann sobre o terreno em causa. É a partir
daí que Eichmann diz ter ficado a saber que o terreno já não pertencia à
Académica. O clube já tinha encetado negociações com uma outra entidade, a
Champions Castle, empresa de compra e venda de imóveis sediada em Matosinhos,
tendo o terreno sido vendido por 1 milhão e 975 mil euros. De acordo com o
empresário, a escritura do negócio envolveu a venda do terreno em troca de dois
contratos de empreitada, que iriam ser celebrados com a empresa Tecnifeira -
Engenharia e construção, também de Matosinhos, sendo esta entidade o
intermediário que assumiria a dívida da Champions Castle. Os contratos de
empreitada tinham em vista as obras de renovação do pavilhão desportivo, bem
como de construção do campo de hóquei em campo junto ao Parque da Cidade de
Espinho. "O pior dos piores é que venderam o terreno sem receber nenhum
dinheiro e ainda o hipotecaram, porque essa entidade comprometia-se a fazer as
obras no pavilhão da Académica e à revelia dos sócios. Há aqui, no fundo, uma
vigarice de todo o tamanho e temos matéria para pedir a anulação desse negócio
com pedido de indemnização", entende o empresário de 55 anos, que já
avançou com uma ação judicial. Só dois meses depois, a 23 de setembro, é que a
Académica de Espinho apresenta aos sócios, em Assembleia Geral, a ratificação
do contrato do terreno, cujo negócio foi aprovado por unanimidade. "Fazem
a Assembleia muito mais tarde, para terem autorização daquilo que já tinham
feito. Foi tudo feito em cima do joelho e sem ninguém saber", acusa
Henrique Eichmann. José Pedro Ribeiro, DE 30dez2021.
- 16 mapas de que os norte-americanos não gostam de falar. Max
Fisher, Vox.
Sem comentários:
Enviar um comentário