As plantas são mais inteligentes do que nós?
- Sim, não é uma metáfora. As plantas são mesmo mais
espertas do que nós. Se a inteligência é uma qualidade da vida, o resultado é a
capacidade de sobreviver. As plantas mostram que são incrivelmente mais
inteligentes porque estamos à beira da extinção. O Homo sapiens está na Terra
há 300.000 anos, mas a duração média de vida de uma espécie no planeta é de 5
milhões de anos. Para atingir esta média, teríamos de sobreviver a mais 4
milhões e 700.000 anos, e isto é impossível neste momento. Só a ideia de
estarmos aqui por mais 100.000 anos torna isso impossível. O que fizemos ao
planeta, fizemo-lo em alguns milhares de anos. Isto dá-nos uma ideia muito
imediata da nossa estupidez. Na verdade, estamos a provar que somos a espécie
mais estúpida do planeta. Deste ponto de vista, os nossos cérebros não parecem
ser uma vantagem evolutiva, mas sim uma desvantagem.
As plantas têm memória?
- Há sete anos demonstrámos pela primeira vez que as
plantas são capazes de memorizar e aprender. Queríamos mostrar que as plantas
podiam aprender, o que não podem fazer sem memória. Assim, pegámos na espécie
Mimosa pudica, uma planta que fecha as suas folhas se lhe tocarmos, e
interrogámo-nos se poderia aprender que um determinado estímulo não é perigoso.
Utilizámos o estímulo de deixar cair o vaso em que a planta estava a partir de
uma altura de 10 centímetros. À primeira e segunda vez fechou as suas folhas.
Mas após quatro ou cinco vezes, já não fechou as suas folhas. Por outro lado,
se lhe tocávamos, fechava as folhas. Assim, ela aprendeu que havia dois
estímulos diferentes, o cair - que não era perigoso - e o tocar - que era.
Depois deixámo-la numa estufa durante dois meses e sujeitámo-la aos mesmos
estímulos. Ela ainda não fechava quando a deixámos cair. Foi impressionante.
Não sabemos quanto tempo dura esta memória, mas há indícios de que poderão ser
anos. Uma árvore talvez possa armazenar informação durante décadas.
As plantas são também seres sociais que comunicam…
- De facto, são bastante capazes de compreender quem está
próximo delas e de mudar o seu comportamento em função dos seus vizinhos.
Também mudam a forma como comunicam. Fazem-no através das suas raízes,
utilizando produtos químicos ou sinais elétricos, e com voláteis, substâncias
que libertam para o ar e espalham mensagens. Hoje sabemos que elas trocam toda
a informação que têm com o seu clã, que trocam menos informação com plantas da
mesma espécie que não pertencem ao seu clã, e ainda menos com outras plantas.
Com o seu clã trocam informações sobre a qualidade do solo, ar, água, etc.,
enquanto com outras plantas apenas trocam informações sobre se existe perigo.
Isto significa que, de certa forma, elas cuidam umas das
outras?
- Sim, e de uma forma muito eficiente. Hoje sabemos que,
numa floresta, quase todas as árvores estão ligadas através das suas raízes. E
com esta rede subterrânea trocam não só informação, mas também água e
nutrientes. Quando uma árvore não consegue absorver os nutrientes e a água de
que necessita, as outras plantas do clã fornecem-lhas. Há muitas experiências
que mostram que um tronco de árvore cortado, que teria de ser uma planta morta
porque não tem folhas, continua a crescer, produzindo novos anéis. Isto
significa que a planta está viva.
Como é que consegue?
- Tem sido um mistério mas recentemente foi demonstrado
que as plantas circundantes mantêm-no vivo. Porquê? Não é por serem boas. É
mais uma questão de eficiência. Preferem manter um tronco vivo do que viver na
incerteza de não saber quem irá ocupar esse espaço.
Compreendo que as plantas são sensíveis à luz, aos
choques e que podem ter sentidos semelhantes ao paladar e ao olfacto. Mas será
que elas sentem?
- Sim. Esta é uma das descobertas do meu laboratório. Há
dez anos mostrámos que se aplicássemos um som a uma frequência de 200 hertz,
que é uma frequência caraterística da água corrente, às raízes de uma planta,
todas as raízes cresciam em direcção à fonte do som.
O que podemos aprender com elas?
- Construímos o mundo à nossa própria imagem. Somos feitos
com um cérebro que governa órgãos especializados. E fazemos tudo desta forma: o
nosso governo, a nossa organização, computadores, telefones, etc. Não é por
acaso que num organigrama haja uma cabeça e órgãos. Mas há que ter em conta que
é assim que uma parte irrelevante da vida é estruturada. Nós, os animais, somos
apenas 0,3% do peso da vida. As plantas são 85% e utilizam uma organização
descentralizada que tem muitas vantagens. Nas nossas organizações, se um dos
órgãos colapsar, todo o corpo ou organização morre, ao passo que pode
retirar-se 80% do corpo de uma planta sem qualquer problema. Penso que, em
comparação com as estruturas hierárquicas, esta organização é incrivelmente
mais vantajosa. A hierarquia só tem a vantagem da rapidez, mas esta vantagem
acaba por se perder como resultado da burocracia, que é inerente às estruturas
hierárquicas. Não faz sentido fazer as coisas dessa maneira. É por isso que
penso que precisamos de nos inspirar nas plantas.
Os aspectos éticos devem ser tidos em conta ao fazermos
experiências com plantas?
- Há, sem dúvida, diferenças entre plantas e animais, mas
acredito que as plantas devem ter direitos. Isto não significa que não possamos
comê-las ou usá-las. As plantas são incrivelmente diferentes de nós. Para um
animal, ser comido é a pior coisa que lhe pode acontecer. Mas as plantas, em
muitos casos, querem ser comidas. Normalmente olhamos para as plantas como se
fossem animais e isto é um grande erro. Os frutos, por exemplo, são uma parte
do corpo das plantas que têm a função de serem comidos por animais. De certa
forma, as plantas querem que alguém as coma porque começam uma relação. Quando
domesticamos lobos e obtivemos cães, ambos ganhámos vantagens. O mesmo se passa
com as plantas. Não usamos o trigo ou as uvas, mas estabelecemos uma relação em
que eles também nos usam como um vetor maravilhoso para se espalharem pelo
planeta. E os vetores são essenciais para as plantas, porque elas não se podem
mover. Deste ponto de vista, penso que as plantas devem ter direitos, mas temos
de compreender o que significam estes direitos. O abate de uma floresta é um
erro ético e também um erro prático, porque a nossa vida depende dela. No
fundo, quando digo que precisamos de dar direitos às plantas, isso também é uma
ideia antropocêntrica. Temos de as proteger porque a nossa sobrevivência
depende delas.
Stefano Mancuso (director do Laboratorio Internacional de Neurobiología das Plantas na Universidade de Florença), entrevistado por Toni Pou, para a ARA.
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