Foto: Paul
Mayall/Alamy
- «Não costumo muito ficar envergonhado com a atitude de outros, em particular quando não tenho muitas expectativas sobre o seu comportamento. Mas envergonha-me a cena de submissão que os dirigentes europeus da UE e da NATO têm feito diante de um Trump que os insulta, ataca, ameaça, mente descaradamente, gaba-se, batendo no peito como os gorilas, faz afirmações inaceitáveis, chantageia-os com tomadas de posição de enorme gravidade para a paz e segurança dos seus países, mostra desprezo pelos seus acordos e alianças, interfere na política interna das democracias (nas autocracias e ditaduras nem uma palavra), ou seja, faz tudo o que não deve fazer por nenhuma regra diplomática, de bom senso, de educação, e eles sorriem, baixam a cabeça, apressam-se a correr para o lugar na fotografia, como gnomos que são. Ao lado do que aconteceu nesta visita europeia de Trump, as declarações do G7 parecem um acto de heroicidade, pelos vistos já esquecido. Ver Theresa May ao lado de Trump a comportar-se como uma ovelhinha, a permitir que ele minta descaradamente sobre o que disse no dia anterior, a acusar os jornalistas do Sun de manipular as suas palavras, quando estes tem a entrevista gravada e passaram as partes controversas logo a seguir para mostrar quem mente, a aceitar os elogios do mesmo homem que lhe provocou no dia anterior consideráveis estragos num poder já de si muito frágil, diz muito da covardia e da hipocrisia da senhora. (…) O que faz falta é que alguém diante de Trump e em directo lhe responda de forma clara e inequívoca, que se levante e lhe diga algumas verdades, já que não conseguirá dizer muitas, porque será calado e escoltado para fora da sala. Que faça aquilo que os anarquistas chamavam “a propaganda pelo exemplo”, uma das coisas mais poderosas quando se pode fazer diante de milhões de pessoas que estão a ver ou vão ver, como seja dizer esta simples frase: “O senhor Presidente, sua Excelência, Sir, sua Majestade, sua Eminência, Grande Negociador, etc., por que razão o senhor mente tão sistematicamente, por que razão é um mentiroso?”(…) Eu admito que eles possam ter medo de Trump e, pensando bem, não é uma atitude desprovida de sentido, porque o homem é muito perigoso. Mas o que estes gnomos fazem está muito acima do medo, é um exercício que mistura reverência ao poder, subserviência, e pura e simplesmente vaidade por estarem ali ao lado do Presidente dos EUA, a bater nas costas uns dos outros, e pensando: “Que importantes que nós somos.” Eles não gostam de Trump, riem-se dele em privado, denunciam-lhe as grosserias entre amigos, contam as anedotas malévolas sobre as Stormy Daniels da vida dele, sugerem que ele está nas mãos de Putin, mas lá, diante dele, perdem a bazófia toda. Desde o primeiro dia que penso e escrevo que com Trump só resulta a intransigência total. Nem salamaleques, nem sorrisos, nem sequer vontade de estar perto. As pessoas dignas do Reino Unido estão na rua a protestar, sob a imagem cruel do balão representando um bebé Trump birrento, mau como só uma criança pode ser. No fundo, estamos na pátria de William Golding, o autor de O Senhor das Moscas, que retrata como um grupo de crianças regressa à selvajaria quando deixados sós numa ilha. Levantem bem alto o balão e passeiem-no bem visível diante de Theresa May e dos seus confrades europeus, crescidos no corpo e na idade e pequeninos em tudo, servos do Senhor das Moscas.» José Pacheco Pereira in Os gnomos de Trump e o Senhor das Moscas - Público 14jul2018.
- «(…) Estou cansado de ler a mesma crónica semanal na Visão, escrita de várias formas e com a arrogância de quem se julga predestinado. Só lhe falta rogar o perdão das tias, que tão deliciosamente caricaturou. Na última crónica da Visão, esta semana, após diversas manifestações de desprezo por vários escritores, enalteceu Agustina (Bessa Luís), de facto uma grande escritora, a que Óscar Lopes teceu os maiores encómios. O sr. Antunes refere-a para lhe atribuir, entre outras, esta ‘boutade’: “– Ó Saramago você devia fumar. Saramago, que não era escritor, era um pregador, respondeu-lhe - Mas o tabaco faz mal - e ela implacável - Pois faz mas você assim escrevia menos”. O título da crónica parece uma lúcida autocrítica “De onde menos se espera é que não sai nada de jeito”, e é apenas um medíocre exercício de quem retribui favores e destila frustrações, iniciando e finalizando o texto a afirmar que “o livro com que ando agora me está a dar cabo da cabeça”. Não precisa de o escrever, a cabeça já não tem arranjo. Se a longevidade lho permitisse, acabaria mandatário da candidatura de Passos Coelho a PR. Não contribuiria para o Nobel, mas imitaria o falecido mano João que, depois de ter sido o mandatário nacional de Jorge Sampaio, acabou mandatário de Cavaco Silva.» Carlos Esperança, in O azedume de António Lobo Antunes - FB.
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