Imagem: Público.
- «(…) Morreram centenas — o Estado Novo falou em 462 mortos, os jornalistas Pedro Alvim, Joaquim Letria e Fernando Assis Pacheco contaram perto de 700. Morreram os pobres, que viviam em habitações precárias nos leitos de cheia, construídas ilegalmente enquanto Lisboa crescia para fora da cidade. E os pobres em sorte, que habitavam os andares baixos e as caves, que dificilmente deram pela entrada da água. (…) Depois, a censura ligou: “A partir desta hora, não morre mais ninguém”, disse um dos funcionários dos serviços da censura ao jornalista da Rádio Clube Português João Paulo Guerra, amigo de Alice Vieira. “A censura carregou com mão de ferro, cortando notícias, distorcendo informações, impedindo os números certos de ser divulgados”, porque nessa altura o Governo de António de Oliveira Salazar percebeu “que seria perigoso deixar que as pessoas soubessem a dimensão exacta do que estava a acontecer”, conta a escritora. “A censura falava quase de cinco em cinco minutos.” Desde segunda-feira, dia 27, que enviava telegramas às redacções: “Gravuras da tragédia: é conveniente ir atenuando a história. Urnas e coisas semelhantes não adianta nada e é chocante. É altura de acabar com isso. É altura de pôr os títulos mais pequenos”, cita o trabalho de Francisco da Silva Costa, Miguel Cardina e António Batista Vieira, “As inundações de 1967 na região de Lisboa: Uma catástrofe com diferentes leituras”. Na quarta-feira, determinava-se: “Os títulos não podem exceder a largura de meia página e vão à censura. Não falar no mau cheiro dos cadáveres. Actividades beneméritas de estudantes — Cortar.” (…) Era 1967: a Guerra Colonial ia a meio e faltava pouco menos de um ano para Salazar passar a presidência do Conselho de Ministros a Marcelo Caetano. O Governo atribuiu às cheias uma retórica de fatalismo. Dizia o Ministério de Interior, numa nota oficiosa, que “somente a violência do fenómeno de carácter excepcional” poderia explicar “cabalmente a grandeza dos prejuízos causados”. Os jornais próximos apoiavam o “carácter inesperado da catástrofe”, dando ênfase à “onda de comoção gerada”. Para um desses jornais, o Diário da Manhã, esta “cadeia de solidariedade humana” era o reflexo da “vitória do homem, que a natureza tinha esmagado”. (…) Acossados pelo regime, que os acusava de “perturbarem a ordem”, estudantes e a imprensa não afecta ao salazarismo afastavam a hipótese de o fenómeno natural justificar a dimensão da tragédia. O Solidariedade Estudantil, boletim dos estudantes que se organizaram para apoiar as populações afectadas, deu a conhecer as estatísticas do Serviço Meteorológico Nacional que mostravam que tinha chovido mais no Estoril, uma zona rica de Cascais, onde não houve mortes nem grandes danos materiais. Para o Comércio do Funchal, cita o estudo de Francisco da Silva Costa, a culpada pela maioria das mortes era a “miséria que a nossa sociedade não neutralizou”. “Até na morte é triste ser-se miserável. Sobretudo quando se morre por o ser”, lia-se. Eram “zonas mártires de inundações”, apelidava o Avante!, o jornal do Partido Comunista, então na clandestinidade, na edição de Dezembro de 1967. “As inundações não teriam originado semelhante tragédia se o Governo se tivesse preocupado em resolver da habitação para os trabalhadores, se tivesse cuidado da regulamentação dos rios e da defesa das populações ribeirinhas, se tivesse tomado as medidas de emergência que as circunstâncias impunham.” “Porque não foram destruídos pelas chuvas diluvianas os bairros residenciais de Lisboa, mas sim os bairros de Urmeira, Olival Basto, Pombais, Quinta do Silvade, Odivelas?”, questionava. (…) O que não podiam escrever nos seus jornais, Alice Vieira e Fernando Assis Pacheco, acabados de sair do curso de Filologia Germânica, contaram à revista alemã Quick (que saiu de circulação em 1992). “Contámos tudo o que vimos e o que aquilo representava. Aquilo era a falência do Estado.” A imprensa internacional foi o socorro dos jornalistas nacionais e não escapou, por isso, às amarras do regime. A PIDE interrogou o então correspondente da United Press International, Edouard Khavessian, depois de a agência ter publicado sobre os protestos estudantis contra a inacção do Governo. (…) Durante duas semanas, os estudantes reuniram-se em Lisboa numa comissão que funcionava na associação de estudantes do Instituto Superior Técnico, da qual fazia parte a Juventude Universitária Católica e associações de estudantes do Porto e Coimbra. Organizaram-se brigadas de estudantes de Medicina que vacinavam contra a febre tifóide, outros limpavam casas e ruas, ajudavam nos funerais, recolhiam e entregavam mantimentos, educavam para a segurança sanitária. No total, compilou o historiador António Araújo, esta comissão deu mais de mil refeições por dia, envolveu 5760 estudantes em 44.080 horas de trabalho voluntário. (…)» Grandes cheias de 1967 – A noite do fim do mundo, in Público 12nov2017.
- A corrida teve o rótulo da EDP. A câmara de Espinho pagou 18.450 euros à RUNPORTO.COM - ORGANIZAÇÃO EVENTOS DESPORTIVOS LDA. pelos serviços prestados. Tudo por ajuste direto. A fatura, em suaves prestações mensais, segue dentro de momentos para a sua morada.
Sem comentários:
Enviar um comentário