por Nuno Gomes Oliveira, FB.
«(…) De fato a gaivota-de-patas-amarelas (Larus michahellis) – das várias espécies de gaivotas existentes em Portugal esta é a única problemática – começou a nidificar nos telhados da região do Porto há cerca de duas décadas, fruto do enorme aumento da sua população.
De espécie claramente ligada às praias, lagos e rios, a gaivota-de-patas-amarelas “urbanizou-se” devido à disponibilidade de alimento na cidade, bons locais de nidificação, ausência quase total de predadores e outros inimigos e uma longevidade até 35/40 anos.
Coloca questões de saúde pública, visto que os seus excrementos, quando secos e pulverizados pelo vento, podem espalhar Salmonella spp., Escherichia coli e outros agentes infeciosos para o Homem. A elevada capacidade de deslocação destas gaivotas, quer diária, quer ao longo do ciclo anual, faz delas disseminadoras desses agentes patogénicos em toda a costa portuguesa e na sua restante área de distribuição (Norte de África e Europa).
As “gaivotas urbanas” degradam lagos e águas para rega e consumo humano com coliformes totais e fecais, estreptococos fecais, Clostridium perfringens e outros agentes patogénicos que se podem transmitir ao Homem e a outras espécies animais.
Além disso, as “gaivotas urbanas” provocam poluição sonora (até porque voam à noite, por vezes em grandes e ruidosos bandos), degradam edifícios e viaturas, entopem caleiras e competem com outras aves, comportando-se como verdadeiras “aves de rapina”.
Mas em meio urbano a queixa que mais correntemente chega às autoridades é o ataque a pessoas como consequência da defesa dos ninhos. Em últimos andares de prédios, com pátio ou varanda, se acontece um casal de gaivota-de-patas-amarelas nidificar no telhado, fica arriscado vir ao pátio pois a curta distância ao ninho vai desencadear um ataque ao “intruso” (o morador) de que podem resultar ferimentos ligeiros.
A solução é usar uma proteção da cabeça e pescoço... e uma vassoura!
Como forma de prevenção podem colocar-se nos locais de pouso fitas com espetos plásticos que facilmente se compram na Rua do Almada (Porto) ou na internet.
Em alguns locais foi autorizado pelo ICNF (Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas) a anulação da nidificação mergulhando os ovos de modo a asfixiar o desenvolvimento do pinto. Mas esta é uma solução complicada até porque a maioria dos ninhos se encontra em locais de difícil acesso, requerendo o apoio dos bombeiros.
Mas porque aumentou tanto a população de gaivota-de-patas-amarelas?
Nos primeiros anos, pela disponibilidade de grande quantidade de alimento (estas gaivotas comem, praticamente, tudo) em lixeiras e falsos aterros sanitários espalhados em redor da Área Metropolitana do Porto, por vezes a dezenas de quilómetros.
Por isso era (e ainda é) frequente ver, ao fim da tarde, bandos de gaivotas vindas de sul ou do Norte para dormirem nas calmas praias de Matosinhos ou de Gaia.
Hoje essas lixeiras estão praticamente encerradas e os aterros sanitários existentes são muito cuidadosos com o controlo das gaivotas, quer por taparem com terra, de imediato, os resíduos urbanos depositados quer, em alguns casos, por recorrerem aos serviços de falcoeiros que as afastam.
Graças a isso, tenho a noção, não comprovada cientificamente, que o problema está a diminuir rapidamente.
Resta a prática condenável de alguns equivocados “amigos dos animais” que colocam restos de comida na via pública e, assim, sustentam gatos, ratos e gaivotas.
Para além de assegurarem o sustento de uns quantos casais de gaivotas que se habituam a ir, à hora certa, comer estes restos, esta prática incentiva a reprodução de gatos, um predador altamente nocivo para a biodiversidade, particularmente para pequenos pássaros, répteis, borboletas, etc.
Se se se acondicionar devidamente o lixo doméstico, se houver cuidados na descarga de peixe nas lotas, se os pseudo “amigos dos animais” deixarem de colocar restos de comida na via pública, a população urbana de gaivotas-de-patas-amarelas em poucos anos regredirá para números aceitáveis não sendo necessário recorrer a medidas mais radicais e a caros estudos que servem para concluir o óbvio.
Em ecologia designam-se por “fatores limitantes” os parâmetros que controlam o desenvolvimento das populações animais ou vegetais: no caso das “gaivotas urbanas”, a disponibilidade de alimentação, de água, de locais para nidificação, as doenças e a falta de predadores são alguns dos parâmetros que importa ter em conta; a disponibilidade de alimentação é, contudo, o fator mais fácil de controlar e de efeitos mais imediatos.»
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