sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Bico calado

Rio Balsemão, próximo de Cotelo. Foto de Luís FilipeCorreia.

«Um paradoxo com efeitos desastrosos governa aquilo que ainda resta da sociedade do trabalho: há cada vez menos trabalho, mas quem o tem está submetido a ele em excesso. Calcula-se que um trabalhador no século XXI trabalha mais tempo por ano do que um operário do século XIX. (…) Uma discussão séria sobre as vantagens de distribuir por mais pessoas a totalidade de trabalho existente (…) permanece encerrada em círculos académicos e nenhum político ousa trazê-la para o espaço público. E também nunca se notou que aqueles que têm trabalho estejam dispostos a começar a interrogar este regime. Continua-se a raciocinar nestes termos: a menos horas de trabalho corresponderá um salário menor, logo, nem pensar nisso. (…) Este regime absurdo que faz com que o trabalho só conheça dois regimes extremos, o do excesso e o da falta, afecta todos os assalariados. (…) O que é que caracteriza verdadeiramente um presidente ou administrador de uma empresa? É alguém que não tem tempo porque o seu tempo é tão caro que ele o vende todo a preço de ouro (…) No final, tem sempre muito dinheiro, mas nenhum tempo. Daí a pergunta ociosa que fazem todos os cidadãos curiosos, quase sempre sem tempo nem dinheiro: o que é que fulano X, por exemplo o presidente de um banco estatal, faz com o seu sobre-salário colossal (…) se não tem tempo para o gastar? É certo que ele pode, com a rapidez de um clic, gastar uma fortuna. Mas para gozá-la precisa de tempo. (…) » António Guerreiro in Trabalho, tempo, dinheiroPúblico 23dez2016.

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