sexta-feira, 13 de maio de 2016

Bico calado

Pedra boroa, Serra da Freita. Imagem de Teresa Poças 12mai2016.
  • «De há uns anos a esta parte, quando é preciso desqualificar uma proposta de um adversário, os políticos (ou pelo menos uma parte deles) têm sempre um último argumento de algibeira: a proposta é ideológica. E se é ideológica, é porque não presta. É um argumento pobrezinho mas, pelos vistos, é popular (ou pelo menos foi assim que lhes ensinaram). Como é evidente, só as propostas do adversário se podem classificar como ideológicas. Se o político que despreza a ideologia que adivinha por detrás de uma proposta do adversário tiver tomado uma decisão ou apresentado uma proposta sobre a mesma matéria, mas em sentido contrário, naturalmente que se escudou, não na ideologia, mas no pragmatismo ou, ainda melhor, no interesse público. Vem esta introdução a propósito da polémica sobre os contratos de associação do Estado com os colégios privados. E em particular com os argumentos usados por Pedro Passos Coelho. Convém notar que o antigo primeiro-ministro não tem direitos de autor relativamente a este tipo de tática. Mas tem-na aplicado com zelo. A proposta do ministro da Educação socialista de reduzir, já no próximo ano letivo, o número de turmas contratadas com as escolas privadas, nos concelhos em que as escolas públicas tenham capacidade para acolher os alunos em início de ciclo, é qualificada pelo líder do PSD como "anacrónica", "retrógrada" e, cereja no topo do bolo, "cegueira ideológica" (ainda por cima quando se sabe que também é defendida pelo perigoso comunista que lidera o mais poderoso sindicato de professores). Recoloquemos a questão. Privilegiar os recursos disponíveis na escola pública quando está em causa a gestão do dinheiro dos contribuintes é "cegueira ideológica". Já cortar 1300 milhões de euros, em três anos, na Educação (mais do dobro do que nos exigia a famigerada troika); fechar mais de 2500 estabelecimentos de ensino; reduzir, em quatro anos, o número de professores nas escolas de 141 para 111 mil; e, finalmente, garantir a sobrevivência de escolas privadas com o dinheiro dos contribuintes, mesmo quando não servem para cobrir as falhas do sistema público, só pode ser qualificado como moderno (antónimo de anacrónico), progressista (antónimo de retrógrado), e sem pitada de ideologia (uma coisa tão má que não se deve sequer procurar um antónimo). Há que reconhecer: os adjetivos usados por Passos Coelho são fortes e atrativos. Têm aquela musicalidade e simplicidade que nos permite trautear a música, mesmo sem perceber a letra. Mas também revelam uma certa cegueira. Sem ideologia, que não se pretende aqui ofender ninguém.» Rafael Barbosa in Cegueira ideológicaJN 12mai2016.
  • «Estou muito contristado com a malfadada sorte que desabou sobre os liberais do meu país. Eles queriam levar-se a sério, tinham livros publicados, crónicas avulsas, ideias bastantes, propostas pensadas, mas eis que a zaragata dos colégios privados os lançou num ápice nas mãos dos estatistas ou até os tornou exemplos do pensamento “soviético”, para citar um deles: tudo o que querem agora é o dinheirinho do Estado para financiar a “iniciativa privada”. De repente, ei-los que passam a adorar o Orçamento de Estado, sem ele não há mercado, passam a estimar as verbas que o monstro público distribui, desde que lhes caiba o quinhão, e proclamam que, sem os cabedais do Estado, o liberalismo fenece para todo o sempre e a liberdade esvai-se.» Francisco Louçã in É tão fácil ser liberal quando o Estado paga a tença, FB.
  • «(…) como é que os contratos de associação acabaram por se multiplicar desta forma? Trata-se apenas de mais um caso de captura do Estado por interesses privados, de que o último governo e o ministério de Nuno Crato em particular foram exemplo. Em vez de gerir de forma prudente as finanças públicas (com uma verdadeira e proba austeridade), o governo de Passos Coelho decidiu aplicar a cartilha neoliberal, degradando os serviços públicos e criando mercado para o sector privado, apropriando-se de dinheiros públicos retirados à escola pública para os distribuir, indevidamente, por organizações privadas, mesmo em zonas onde existia cobertura pública. As escolas com contratos de associação viciaram-se no dinheiro e no tratamento de favor. E, para reforçar a sua posição, foram ao extremo de atrair alunos fora da área que tinham a responsabilidade de cobrir, matando dois coelhos de uma cajadada: retirando argumentos ao financiamento da rede pública e reforçando os seus proventos. O que o actual Governo pretende é que se regresse ao cumprimento da lei, a uma prudente gestão do erário público e à devida rentabilização da rede escolar pública que é, para mais, muito mais barata que manter turmas com contrato de associação em colégios privados e oferece um serviço de muito maior qualidade para todos - e não apenas para alguns. A actual discussão teve um mérito. Provou uma das razões por que o estado deve manter uma rede escolar pública, onde se ministra um ensino que não segue “quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas” que não sejam o primado dos direitos humanos e da lei, em vez de, por exemplo, subcontratar escolas privadas para o fazer. É que as escolas privadas, que têm todo o direito de ser ideológicas ou confessionais, para além da selecção de alunos que praticam têm uma enorme dificuldade em manter a neutralidade que se exige à República. E isso viu-se neste confronto, onde não só pais mas também directores e professores das escolas privadas instrumentalizaram os alunos menores em defesa das suas posições ideológicas e dos seus interesses privados, numa demonstração rara de falta de escrúpulos.» José Vítor Malheiros in Os vícios públicos das escolas privadasPúblico 12mai2016.
  • «(…) Em suma, o pafioso Gomes Ferreira mais parecia o chefe da oposição a querer destruir as explicações e os argumentos do Primeiro-Ministro. Seria ele capaz de fazer uma entrevista, no mesmo tom truculento a Passos Coelho ou ao irrevogável Portas? (…) Eu se fosse ao Balsemão despedia-te, ó Ferreira, porque acabaste por dar um grande tiro no pé, já que o resultado do prélio foi: Costa 3, Ferreira 0 e virou-se o feitiço contra o feiticeiro. A geringonça está de boa saúde e recomenda-se e no horizonte não se vê borrasca a não ser aquela que a Direita catastrofista teima em anunciar todos os dias.» Estátua de Sal.
  • «José Mourinho terá sido multado pelo Fisco espanhol e obrigado a pagar dois milhões de euros. No período em que comandou o Real Madrid, o técnico de Setúbal não declarou os seus direitos de imagem como Imposto de Empresa, em vez de o fazer a título individual, IRS – IRPF em Espanha. Durante o período acima citado, Mourinho tinha acordos com as seguintes marcas: Samsung, do Millenium-BCP, Hublot, Jaguar, Braun, American Express, Henderson Global e Adidas.» CM. Vagamente relacionado: «Contratos de Mourinho e Ronaldo fintaram Finanças Firma sediada na Irlanda detém os direitos comerciais. Utilização das imagens de Mourinho e Ronaldo em Portugal não pagam impostos no País. CM 18dez2010.
  • A Assembleia Legislativa da Madeira aprovou um voto de protesto pelas declarações da eurodeputada Ana Gomes. Em causa, está uma carta enviada pela parlamentar socialista à comissária europeia para a Concorrência, Margrete Vestager, na qual critica a “opacidade” do Centro Internacional de Negócios da Madeirae define a zona franca madeirense como uma praça offshore. Em resposta, a Comissão Europeia requereu ao Governo português a lista das empresas estabelecidas no CINM que obtiveram benefícios fiscais em 2014, pedindo uma relação sobre os montantes recebidos, o número de empregos criados e as características dos beneficiários. Público 11mai2016.

Sem comentários: