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Morte do Rio Doce: um crime com muitos autores,
por Alessandra Cardoso in EcoDebate.
Pontos a reter:
1 «(...) existem três responsabilidades que precisam ser mais claramente identificadas. A primeira é a responsabilidade da Samarco e solidariamente da Vale e da BHP Billinton. (...) A Samarco nada mais é do que uma “associação em que duas entidades se juntam para tirar proveito de alguma atividade, por um tempo limitado, sem que cada uma delas perca a identidade própria” – o que se denomina joint venture. Expressão clara de como as estratégias e decisões destas três empresas estão umbilicalmente conectadas é a utilização pela Vale da base de beneficiamento da Samarco para processar e armazenar rejeitos do seu minério de mais baixo teor extraído das minas de Fábrica Noba/Timbopeba e de Fazendão, também na região de Mariana. (...) cerca de 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos da barragem do Fundão que inundou o Rio Doce, pelo menos 5% vinha das minas da Vale.»
2 «(...) É importante lembrar que no coração desta máquina financeira de extração de minérios está a Vale, que detêm 85% da produção brasileira de minério de ferro. Este gigante transnacional tem seu controle operacional dominado pela Valepar, que detêm 53,9% das ações da Vale, e é nada mais é do que um pull de investidores nacionais e estrangeiros.
A maior acionista da Valepar é a Litel Participações S.A., que detém 49% das ações e que, por sua vez, é controlada pelos três maiores fundos de pensão do Brasil (Previ, Funcef, Petros). Portanto, trabalhadores do Brasil que têm suas economias administradas por estes fundos de pensão devem se sentir indiretamente responsáveis pela morte do Rio Doce. Entre os outros três grandes acionistas da Valepar está o BNDES, que por meio do BNDESPAR controla 11,51% das ações da empresa e tem assento no Conselho de Administração da Vale. Portanto, o governo brasileiro também tem que se sentir responsável, diretamente e indiretamente, pela destruição socioambiental no Rio Doce. O BNDES também é financiador da Samarco. Os dois recentes projetos de expansão da capacidade de extração, beneficiamento (e geração de rejeitos) e escoamento da empresa foram financiados pelo BNDES. Em 2008 e 2014, o banco aprovou financiamentos para expansão da capacidade de extração e processamento da Samarco.»
3 «(...) Também sabemos que o Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM, responsável pela fiscalização o cumprimento da Lei, está sucateado. Atualmente, existem apenas 20 técnicos em todo país para fazer a fiscalização de mais de 200 barragens – e pior, sem uma qualificação específica em engenharia de barragens. Em Minas Gerais, o DNPM afirma ter capacidade de fiscalizar apenas 4 barragens por ano.»
4 «O que precisa ficar mais claro é que a responsabilidade do governo brasileiro nessa tragédia vai além de fazer as empresas cumprirem a lei. O governo é igualmente responsável, como poder concedente, por permitir e até incentivar uma expansão agressiva na exploração mineral no Brasil por meio de uma legislação ultrapassada, o Código Mineral de 1967. Hoje, a jazida é de quem chegar primeiro no balcão no DNPM, e uma vez concedido o direito de explorar o recurso mineral, a extração se dá na intensidade e voracidade que o mercado quiser. (...) O desastre socioambiental de Mariana é sim produto desta expansão sem precedentes da extração de minério de ferro na história do Brasil. Uma expansão puxada pelo chamado super ciclo de commodities da última década, que elevou o preço da tonelada de minério de ferro a US$ 187,18 em 2011. Essa demanda mundial agressiva levou a uma corrida de investidores para ampliar a extração, processo que, uma vez iniciado com vultosos investimentos e expectativas de retorno, foi intensificado ainda mais diante da queda subsequente de preço, para manter o lucro – e o retorno dos muitos acionistas. A ausência de uma regulação do setor e das suas condições socioambientais de exploração está, portanto, na raiz desse trágico episódio comandado por uma articulação de interesses entre as grandes corporações, ávidas por lucros, e pelo governo brasileiro, ávido por superávits comerciais.
Por fim, a responsabilidade do governo estadual. (...)»
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