domingo, 11 de janeiro de 2015

Bico calado

  • Caso dos cartoons leva à condenação no tribunal de Elvas.
  • Atentado low cost – quase ninguém falou, ninguém se comoveu, ninguém chorou: Bomba que menina carregava no corpo explode e mata 20.
  • «Não, não sou e espero nunca ser Charlie. Nem Charlie nem nenhum dos assassinos que o abateram. Não ganho a minha vida nem uso a liberdade de expressão, o talento, o humor e o impacto mediático para promover o obscurantismo e o ódio xenófobo e anti-religioso (para mim o humor tem limites, sim, tem os limites do amor e da compaixão, pois não consigo achar piada a ofender quem quer que seja) e também não sou um bárbaro e um idiota que pretende defender a religião que acha que é a sua matando e alimentando o ódio contra ela e a consequente xenofobia. Se sou alguém então sou todas e cada uma das vítimas anónimas e silenciosas desta civilização estúpida e cruel, pelas quais (quase) ninguém ergue a voz e sai à rua, muito menos em manifestações mediáticas, politicamente correctas e apoiadas pelos mesmos poderes instituídos e pelos media que hipocritamente promovem, estimulam e sancionam a violência em larga escala: sou todas e cada uma das vítimas do trabalho explorado e escravo que não são abatidas de imediato, porque isso não seria rentável, mas antes mortas a fogo lento em vidas esvaziadas de sentido como meras peças da engrenagem da produção e do consumo que enriquece as grandes corporações enquanto destrói os seres vivos, os ecossistemas e o património natural do planeta; sou cada um dos indígenas expulsos das suas terras para que o lucro aumente e cada um dos homens, mulheres e crianças que trabalham de sol a sol no outro lado do mundo para que os ocidentais possam ter os trapos que vestem e os fetiches electrónicos mais baratos; sou todos e cada um dos animais explorados, torturados e abatidos, em autênticos campos de concentração, para vestir e alimentar os humanos e aqueles mesmos que hipocritamente saem à rua a protestar contra a violência e a barbárie; sou a atmosfera impregnada de gases poluentes e com efeito de estufa (em grande parte vindos da indústria da carne); sou a terra envenenada por adubos e pesticidas e esventrada pelos lobbies dos combustíveis fósseis; sou todos e cada um dos oceanos, mares, lagos e rios poluídos e repletos de plástico e outro lixo da civilização industrial; sou as florestas destruídas para plantar soja para alimentar os animais que devoramos e imprimir os jornais que promovem a violência. Sou a Vida, da Terra e de todos os seres, sacrificada a cada instante e cada vez mais em nome da única verdadeira religião (ou superstição) que (quase) todos praticam e veneram, digam-se crentes ou descrentes ou de direita, centro ou esquerda: a do “crescimento” económico a todo o custo, mesmo que isso implique a destruição da qualidade de vida e do planeta para as gerações presentes e futuras de humanos e não-humanos. Sim, se sou alguma coisa, sou a Vida. Por isso não tenho tempo nem paciência para ser Charlie. Só tenho tempo e paciência para lhe desejar, a ele, aos seus colegas e aos seus assassinos, a Paz da qual, infelizmente, eles e todos nós andamos tão afastados. » Paulo Borges.
  • «Podemos não ser o Povo mais inteligente, podemos não ser o Povo mais revolucionário, podemos não ser o Povo mais rico, mas somos de longe, o Povo mais solidário do Planeta! Mais: somos solidários só com os outros! Entre nós, não há cá solidariedade p`ra ninguém! Se vemos uns pobres trabalhadores de uma fábrica qualquer que faliu e deixou uma centena de desempregados e estes decidem fazer uma greve ou vígilia e se manifestam nas ruas e impedem o trânsito, logo os condutores portugueses, irritados por não chegarem a horas para ver a telenovela, vociferam pelas janelas: "Ide trabalhar manguelas". Mas se forem uns timorenses a morrer lá muito longe daqui, logo todos se vestem de branco e dão as mãos. Por exemplo, actualmente em Portugal, estão a ser assassinados idosos pelo Goveno Português e ninguém mexe palha, mas agora assassinam 12 franceses tragicamente e logo os portugueses foram para as ruas das nossas cidades com cartazes "Je Suis Charlie". Porque não saem para as ruas os portugueses com cartazes "Je Suis Idoso!? Ou "Je suis jovem-sem-emprego"? Ou "Je Suis explorado"? É extraordinária esta capacidade do Povo português se solidariezar com causas que não sejam suas e ignorar as que lhe dizem respeito.» por Vitor Rua.
  • « (...) Pois bem, eu não sou Charlie. Não me identifico com a representação degradante e “caricaturesca” que faz do mundo islâmico, em plena época da chamada “Guerra contra o Terrorismo”, com toda a carga racista e colonialista que isto congrega. Não posso ver de bom modo essa constante agressão simbólica que tem como contrapartida uma agressão física e real, mediante os bombardeamentos e ocupações militares a países deste horizonte cultural. Tão pouco posso ver com bons olhos estas caricaturas e os seus textos ofensivos, quando os árabes são um dos sectores mais marginalizados, empobrecidos e explorados da sociedade francesa, que têm recebido historicamente um tratamento brutal: não me esqueço que no metro de Paris, no início dos anos 60, a polícia massacrou à pancada 200 argelinos por pedirem o fim da ocupação francesa do seu país, que já tinha deixado um saldo estimado num milhão de árabes “incivilizados” mortos. Não se trata de inocentes caricaturas feitas por livre-pensadores, mas sim de mensagens produzidas a partir de meios de comunicação de massas (sim, ainda que pose como sendo alternativo Charlie Hebdo pertence aos meios de massas), carregados de estereótipos e ódios, que reforçam um discurso que considera os árabes como bárbaros aos quais há que conter, desenraizar, controlar, reprimir, oprimir e exterminar. Mensagens cujo propósito implícito é justificar as invasões de países do Médio Oriente, assim como as múltiplas intervenções e bombardeamentos orquestradas a partir do Ocidente em defesa da nova divisão imperial. O actor espanhol Willy Toledo dizia, numa declaração polémica – por apenas tornar evidente o óbvio –  que “o Ocidente mata todos os dias. Sem ruído”. E é isso o que Charlie e o seu humor negro ocultam por baixo da forma  de sátira. Não me esqueço da capa do Nº 1099 de Charlie Hebdo, em que se banalizava o massacre de mais de mil egípcios por uma brutal ditadura militar, com o beneplácito da França e dos Estados Unidos, através de uma manchete que dizia qualquer coisa como “Matança no Egipto. O Corão é uma merda: não pára as balas”. A caricatura era a de um homem muçulmano crivado de balas, enquanto se tentava proteger com o Corão.  Pode haver a quem isto pareça ter graça. Também, na sua época, colonos ingleses na Terra do Fogo achavam que tinha graça posar em fotografias junto aos indígenas que tinham “caçado”, com amplos sorrisos, carabina na mão, e com o pé em cima do cadáver ensanguentado e ainda quente. Em vez de ter graça, essa caricatura perece-me violenta e colonial, um abuso da tão fictícia como manipulada liberdade de imprensa ocidental. Que aconteceria se eu fizesse agora uma revista cuja primeira página tivesse a seguinte frase: “Matança em Paris. Charlie Hebdo é uma merda: não pára as balas” e fizesse uma caricatura do falecido Jean Cabut crivado de balas com uma cópia da revista nas mãos? Claro que seria um escândalo: a vida de um francês é sagrada. A de um egípcio (ou de um palestino, iraquiano, sírio, etc.) é material “humorístico”. Por isso não sou Charlie, uma vez que a vida de cada um desses egípcios baleados é para mim tão sagrada como a de qualquer desses caricaturistas hoje assassinados. (...)» José Antonio Gutiérrez D.
  • Parece que alguém começou a tentar desmontar a «coisa».
  • Estado vai entregar a privados gestão de 25 Pousadas da Juventude. Depois de enormes investimentos levados a efeito, vai-se entregar de mão beijada? Será que daqui a algum tempo também vão fazer o mesmo me relação às escolas que foram requalificadas?
  • Alentejo eleito como destino a visitar pelo 'New York Times'.

1 comentário:

OLima disse...

«Os massacres de Paris não vão ter alguns dos principais autores no banco dos réus. Foram abatidos durante a refrega que pôs termo à chacina gratuita de inocentes. Mas lá se sentarão, mesmo que só a História os julgue, os poderes fundamentalistas gerados no Yémen e o conjunto de personalidades que hoje encabeça a manifestação de Paris. A explosão afetiva e solidária ‘Je Suis Charlie’ é património de poucos. Não é, de certeza, pertença desta Europa cínica, protetora de ladrões e especuladores financeiros, que há muito se borrifou para os sonhos da Igualdade, da Liberdade e da Fraternidade, gerados no ventre francês e que emigraram por esse mundo fora. Pois o problema é político. Nunca foi religioso. Os presidentes, os primeiros-ministros e outros acólitos que hoje desfilam em França em defesa da liberdade de expressão são os seus carrascos. Nunca leram o ‘Charlie Hebdo’. Apenas bebem as palavras de Merkel. São como os assassinos, que nunca viram o Corão, muito menos o estudaram, e matam em nome do Profeta. A quadrilha que vai liderar a manifestação de Paris prostituiu a Europa, mentiu nos sonhos, matou os projetos de Vida. Esta quadrilha quis emigrantes para a mão de obra escrava e desprezou o valor do trabalho. Desprezou o emprego. Desprezou a escola e a educação. Atirou para a fome e para a ruína milhões de desgraçados. Mas pior do que isto, a Europa cínica que hoje habitamos matou a Europa de Monet. Fez da União Europeia uma pantomima, aceitou de joelhos os ditames da Alemanha que fala por nós, contra nós, imperialismo da especulação que matou sonhos. Quem mata sonhos não pode esperar outra coisa a não ser a multiplicação da raiva, da indignação e, finalmente, do ódio. Estes grupos em desvario são europeus. Nasceram aqui e matam por ódio. E as maiores vítimas até são muçulmanos. Ódio, porque lhes prometeram sonhos e lhes entregaram um imenso vazio. Um vazio onde habitam milhões de outros jovens a quem mataram os sonhos, que não assassinam, mas se desinteressam da política, desprezam os figurões que vão marchar à cabeça da manifestação em Paris, servos e serventuários de especuladores, de offshores, de roubos, não de joias mas de países. Reprodutores de desigualdades, semeadores de injustiças, párias da fraternidade, amigos da liberdade de saque. É esta a Europa cínica, e canalha, que aceitou o apelo de Hollande e vai fazer de conta que é amiga da liberdade de expressão.» Moita Flores in Europa terrorista, CM 11jan2015.

http://www.cmjornal.xl.pt/opiniao/colunistas/francisco_moita_flores/detalhe/europa_terrorista.html