sexta-feira, 30 de novembro de 2012

A Arte de Furtar (12)

“A raposa quando assalta um galinheiro faminta, ceva-se bem nos primeiros dois pares de galinhas que mata, e como se vê farta degola as demais e vai-lhe lambendo o sangue por acepipe. Isto mesmo sucede aos que furtam com unhas fartas, que não param nos roubos , por se verem cheios, antes então fazem maior carniçaria no sangue alheio. São como as sanguessugas, que chupam até que arrebentam. Andam sempre doentes de hidropesia as unhas destes: então têm maior sede de rapinas quanto mais fartos delas. E ainda mal, que vemos tantos fartos e repimpados à custa alheia, que, não contentes da mesma fortuna, fazem razão de estado para sustentarem faustos supérfluos, engolfando-se mais para isto nas pilhagens, para luzirem desperdiçando, porque só no que desperdiçam acham gosto e honra; chamara-lhe eu descrédito e amargura de conscincia, se eles a tivessem.”

A Arte de Furtar, Tomé Pinheiro Da Veiga/Padre António Vieira, p334  – Oficina de Martinho Schagen, Amsterdão 1744

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