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sábado, 20 de dezembro de 2025

REFLEXÃO

ALQUEVA: O REI VAI NU, À VISTA DE TODOS, À VISTA DE NINGUÉM
Cristina Morais, Jornal Maio.


Foto: Alentejo Ilustrado

“(…) Dada a gestão desgovernada do regadio, com objetivos muito pouco claros, os fins múltiplos de Alqueva estão em risco, o que terá consequências graves, porque não estão a ser cumpridos os grandes desígnios com os quais o Estado português se comprometeu com a União Europeia: constituir uma reserva estratégica de água e garantir o abastecimento público de água às populações, produzir energia hidroelétrica, desenvolver a agricultura e promover outras atividades, como o turismo.

Atualmente, Alqueva é um empreendimento agrícola; a tutela mantém-se há anos no Ministério da Agricultura. O regadio tornou-se hoje o seu único objetivo e os fins múltiplos do empreendimento desapareceram — ou talvez só tenham existido na “alfaiataria” dos tecidos mágicos, para captar financiamento comunitário.

Alqueva rega hoje mais de 200 mil hectares. A estes consumos de água acrescem os milhares de hectares regados em Espanha a partir de captações ilegais. A área regada que é conhecida oficialmente é manifestamente inferior à real; é por isso que hoje sabemos que a água de Alqueva já não chega para todas as necessidades. O Governo quer agora fazer um transvase, para que esta água vá regar os abacates no Algarve — sabemos, todos, de quem.

Foram-se os anéis e também os dedos. Alqueva, com a atual gestão da água que não faz, deixou de ser a reserva estratégica, entregou a exploração da central hidroelétrica à EDP a troco de uma renda e limita-se a construir regadio a pedido dos grandes grupos do proclamado agronegócio. A Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas do Alqueva, S.A. (EDIA) deixou de exercer o mandato do Estado, tendo perdido a capacidade de gestão dos bens públicos a ela consignados.

Hoje, são meia dúzia de grupos económicos, fundos financeiros americanos e espanhóis, essencialmente, que determinam o que se rega e onde no Alqueva. Atuam como verdadeiras máfias, e a impunidade destas empresas mantém-se, inclusive no domínio ambiental, onde acontecem verdadeiros crimes, que determinam milhares de hectares sem qualquer capacidade produtiva dos solos, a contaminação destes e da água, a destruição de ribeiras transformadas em valas de drenagem, a progressão de espécies invasoras e o abate criminoso de sobreiros e azinheiras com injeções de alumínio. (…)"

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