Tran To Nga, em abril de 2023. A antiga jornalista intentou várias ações judiciais contra multinacionais em nome das vítimas vietnamitas do Agente Laranja. Nhac Nguyen / AFP.
É um dos maiores crimes ambientais do século XX. Cinquenta anos após o fim da guerra do Vietname, o veneno do agente laranja continua a contaminar o corpo e a terra. Em França, uma nova geração asiodescendente recusa a impunidade.
Para matar à fome e eliminar os combatentes da resistência vietnamita escondidos na selva, o exército norte-americano despejou, entre 1961 e 1971, 80 milhões de litros de Agente Laranja em 400 000 hectares, transformando florestas luxuriantes em desertos tóxicos e arruinando terras agrícolas inteiras. Entre 2,1 e 4,8 milhões de vietnamitas foram diretamente expostos.
Mas o veneno não ficou por aqui: a dioxina que contém infiltrou-se no corpo e é insidiosamente transmitida de geração em geração. Ainda hoje, há crianças que nascem com malformações, cancros e doenças auto-imunes.
Criado em 2004, o coletivo Vietnam Dioxine permaneceu durante muito tempo em segredo. Tran To Nga, uma franco-vietnamita de 83 anos, exposta ao Agente Laranja em 1966, levou a Monsanto e 13 multinacionais a tribunal para ver reconhecida a sua responsabilidade por esta catástrofe sanitária e ambiental. Ela própria viu os seus filhos nascerem doentes, tendo uma das suas filhas morrido com apenas dezassete meses.
A 22 de agosto, o Tribunal de Recurso de Paris negou provimento ao seu recurso, invocando a "imunidade de jurisdição" das empresas. Por outras palavras, não eram responsáveis porque estavam simplesmente a cumprir um contrato com o exército norte-americano. Pior ainda, Tran To Nga foi condenada a pagar 1.500 euros a cada uma das multinacionais envolvidas.
Perante este veredito desfavorável, a Vietnam Dioxine está a intensificar as suas ações e a atacar um sistema de dominação mais vasto. O Agente Laranja não foi apenas um ecocídio: foi um crime colonial. Trata-se de populações racializadas que foram expostas de forma maciça sem nunca terem sido indemnizadas. Entretanto, os veteranos americanos vítimas do mesmo veneno foram indemnizados em 1984. Porque é que algumas vidas valem mais do que outras, porque é que alguns corpos têm direito a indemnização e outros não?
O coletivo vê a sua luta como parte de uma ecologia descolonial, ligada a outras lutas: contra a clordecona nas Antilhas francesas, um pesticida tóxico utilizado nas plantações de banana muito depois de ter sido proibido em França continental; pelos palestinianos expostos ao fósforo branco; pelos agricultores vítimas do glifosato; e pelos povos indígenas que foram despojados das suas terras. “Estes crimes ambientais não são isolados, fazem parte de um mesmo sistema colonial”, dizem. “Esta luta está também a levar o movimento ambientalista a afastar-se de um certo prisma ‘centrado no clima’ ou seja, na redução das emissões de gases com efeito de estufa. Permite aos ecologistas confrontarem-se com os seus pontos cegos.”
Alexandre-Reza Kokabi, Agente Laranja: reavivar a memória de um crime colonial – Reporterre.
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