segunda-feira, 17 de junho de 2024

‘QUANDO PORTUGAL ARDEU’ 5

“Na verdade, a atitude do MRPP durante o PREC prestou-se a várias controvérsias. Logo em 1975, a poucos dias do 25 de Novembro, José Luís Saldanha Sanches, um histórico do partido, cravou a dissidência com a linha oficial do movimento, liderada pelo secretário-geral Arnaldo Matos, que privilegiava o ataque ao PCP. No ensaio intitulado O MRPP – Instrumento da Contra-Revolução, Saldanha Sanches descrevia o estado comatoso do partido, sem esquecer a ausência de prestação de contas: ‘Os fundos do Movimento’, escreveu, ‘são como um saco para onde o dinheiro é atirado, não se sabe por quem, e retirado à medida das necessidades.’ Aquele membro, associado à ‘linha negra’ por defender aproximações à esquerda, descrevia ‘pilhagens’ de verbas no interior do partido, dinheiros desviados por ‘ordem superior’, gastos de luxo e um certo ‘viver à larga’ por parte dos dirigentes. Em várias zonas do País, o MRPP era, segundo Saldanha Sanches, ‘completamente desconhecido’, até mesmo um ‘corpo estranho à classe operária’, habituado apenas a fazer ‘uma agitação estéril e anarquista’. Aquele dissidente, renegado e expulso, acusava ainda a liderança do movimento de apoiar os militares rivais da revolução. Ao mesmo tempo que lhes fornecia ‘argumentos de esquerda’, franqueava as portas ao ‘imperialismo’ americano. Para a História ficaram os encontros secretos do secretário-geral Arnaldo Matos com Mário Soares (PS) e Francisco Sá Carneiro (PPD), o apoio ao Grupo dos Nove, a coqueteria com o Jornal Novo, financiado pelos patrões da indústria (CIP), e o apoio recebido pelo MRPP da parte de várias publicações e jornalistas conotados com a direita, entre os quais se destacava Vera Lagoa.”

Miguel Carvalho, Quando Portugal ardeu (2017) – Oficina do Livro 2022, p 61.

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