Newsletter: Receba notificações por email de novos textos publicados:

segunda-feira, 12 de junho de 2023

Bico calado

  • Os EUA tinham informações sobre um plano ucraniano pormenorizado para atacar o gasoduto Nord Stream. WP. Via Reuters/MSN.
  • Este ano, o presidente da comissão organizadora das cerimónias do 10 de junho escolhido por Marcelo Rebelo de Sousa foi João Nicolau de Almeida, um enólogo. O enólogo é filho do inventor do Barca Velha. RTP.

  • “O 10 de Junho é um cadáver exumado anualmente em soturnas comemorações oficiais. Os EUA exaltam o 4 de julho, data da declaração da Independência, e fazem desse dia a festa nacional. (...) A França fez da tomada da Bastilha, em 14 de julho, o símbolo da liberdade, a festa da Revolução que aboliu as velhas monarquias de direito divino e deu origem às modernas democracias governadas por cidadãos que o voto popular escrutina. O Estado português escolheu, não a independência, não a glória das descobertas, não a liberdade, mas o óbito de um poeta, singular e grande, é certo, mas a morte, nem sequer o nascimento cuja data e local ignora. Os EUA e a França celebram a liberdade e os povos exultam, Portugal evoca a morte e os portugueses deprimem-se. O dia 10 de Junho era na ditadura o «Dia de Camões, de Portugal e da Raça». Era um dia de nojo, na dupla aceção, com os carrascos a distribuir veneras pelas viúvas, pais e irmãos dos militares mortos na guerra colonial. Hoje, em democracia, o dia 10 de Junho apenas perdeu a Raça. É o Dia de Camões, de Portugal e das Comunidades Portuguesas. Não é festa, é velório. Portugal tem uma Revolução para festejar o seu dia, o dia que fez a síntese do melhor que herdámos do liberalismo e do 5 de Outubro, a madrugada que emocionou o Mundo e libertou Portugal da mais longa ditadura do Século XX – o 25 de Abril. Portugal prefere o velório à festa, a véspera da perda da independência à alvorada da libertação, a continuidade das cerimónias da ditadura à aurora de todas as liberdades, à festa do povo e à grandeza épica do 5 de Outubro e do 25 de Abril. A exaltação da data, a nível nacional, deve-se ao salazarismo que aproveitou os heróis da República, expurgando-os do sentido positivista e laico que os republicanos lhes atribuíram, e introduzindo um sentido nacionalista adequado à propaganda fascista. O PR, versão civil e culta de Américo Tomás, começou este ano a comemorar a data, em Braga, no seu jeito excessivo, talvez saudoso de um 28 de maio que abateu a liberdade. Américo Tomás era diferente, nunca foi eleito democraticamente, mas a liturgia pouco mudou na coreografia pífia. (...)” Carlos Esperança, O 10 de Junho do nosso descontentamento.
  • “Conde de Ferreira, notável portuense do século XIX, tem o seu nome inscrito em ruas e instituições da cidade. Era dono de uma enorme fortuna e não tinha descendentes. Deixou-a em testamento a várias entidades: ao Estado português (para que fossem construídas 120 escolas primárias), à Santa Casa da Misericórdia, a várias ordens religiosas. De onde vinha tão vasto pecúlio de uma pessoa que nascera numa família humilde de Campanhã? Dos seus negócios no Brasil e, particularmente, do tráfico de pessoas escravizadas. Foram cerca de 10 mil angolanos que Joaquim Ferreira dos Santos vendeu no Brasil a proprietários do açúcar. As avultadas somas de que tantas “obras sociais” beneficiaram no Porto têm assim a marca sinistra do crime contra esses milhares de seres humanos transformados em mercadoria e violentados na sua dignidade e direitos mais elementares. (...)” José Soeiro, Santa Casa do Silêncio sobre os Traficantes de Escravos - Expresso 8jun2023. Via Esquerda.

  • «Durão Barroso, que aufere mais de 100 mil euros de reforma da UE, junto com milhões (não revelados) como Presidente do Banco Goldman Sachs dá hoje uma entrevista num forum de Astana, capital do Casaquistão, onde diz que “Devemos estar preparados para uma guerra de longa duração”. (...) Ficou por perguntar na entrevista, do DN, qual o volume de negócios da Goldman Sachs na área da guerra, uma pesquisa de um segundo no google leva-nos à página da Goldman Sachs onde à cabeça assume o banco com orgulho investir em “aeroespacial e defesa”. Basta abrir a carteira de investimentos oficiais. Um dos mordomos de uma das mais ignóbeis guerras, do Iraque, onde morreram mais de meio milhão de pessoas, deixando um país destruído, acha que “nem paz nem negociação” (...) Além dos lucros da Goldman Sachs com a guerra poder-se-ia ter feito uma pergunta sobre a pegada ecológica dos jactos particulares, onde entre champanhe estes cavalheiros explicam, ao som de boas óperas, que os tambores de guerra lá em baixo tocam, e os ucranianos e os russos pobres (que os filhos dos ricos não vão para a guerra) são a carne para canhão e os europeus que vivem do trabalho paguem com a inflação os super lucros da guerra, da venda de armas e outros “sacrifícios”. E outra pergunta – muito mais importante, para mim – quantas pessoas foram mortas na repressão aos movimentos sociais de trabalhadores no Casaquistão, em Janeiro de 2022, contra a alta do preços do gás e dos alimentos, repressão feita com a ajuda de tanques russos e o apoio, público, dos EUA e dos seus parceiros europeus. Quando se trata de esmagar trabalhadores não se importam e elogiam os tanques russos? A entrevista termina com uma nota “O DN viajou a convite do Astana International Forum”. Sim, precisamos de debater na esfera pública e com urgência um jornalismo independente do Estado e do mercado. Na semana que Assange arrisca ser extraditado por ter denunciado crimes de guerra, contra o Estado e o mercado. Um grande jornalista, que conheço há muitos anos, disse-me desmoralizado, há poucos dias: “Será Assange o último jornalista?”. Uma provocação, que nos deve fazer refletir.» Raquel Varela, 'Será Assange o último jornalista?'

Sem comentários: