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Quer mesmo saber como meter uns milhões ao bolso?
Por Francisco Louçã in Público de 23dez2015
«Esteja atento, é a primeira recomendação. Mas se tiver
amigos, eles avisam-no. Actue depressa: se souber de um banco em vias de se
afundar e cuja direcção faça hoje ao início da tarde um comunicado a anunciar
que tem um comprador, tudo a correr sobre rodas, mande comprar acções desse
banco ao fim da manhã e venda antes do fecho da sessão. Não gaste muito, não há
mercado para isso. Cem mil euros. Ganha em três horas cinquenta mil.
Para ganhar milhões e não ninharias, é preciso ter outro
estofo. É preciso sobretudo endividar-se muito. Esteja sempre preparado, crie
empresas e grandes negócios a tempo, evite registá-los em Porto Rico, ficou com
má fama depois de ter sido muito gasto, mas Ilhas do Canal, Bahamas, Delaware
ou Vanuatu, tudo serve. E peça crédito bancário, muito. Depois, comunique ao seu
amigo na administração que a coisa correu mal, ele vai declarar que o crédito é
incobrável, assunto arrumado, tudo entre cavalheiros. A beleza de passar de uma
rubrica para outra é esta, não tem que pagar o crédito que é um débito. Se for
accionista, melhor ainda, eles mal olham para a ficha e “xotor porque é que se
há-de incomodar”. Foi assim no BCP e é a regra de ouro entre as pessoas
responsáveis deste país. Somos uns para os outros, com classe.
Quando souber que o banco vai ser intervencionado, agora
diz-se “resolvido”, mexa-se ainda mais depressa. Dívidas e dívidas, endivide
muito as suas empresas da constelação Ilhas do Canal-Bahamas-Delaware-Vanuatu,
os negócios dos últimos dias são os melhores. Vai tudo desaparecer na voragem,
o Estado vai pagar isso tudo, vai incluir a sua dívida no “banco mau” e nos
seus incobráveis, e vai portanto compensar o capital que falta ao “banco bom”.
A sua dívida é um “activo” que foi desactivado.
Pode ainda fazer um contrato com o Estado, uma parceria.
Garante um serviço e eles pagam uma renda. Muita uva para pouca parra. Ou uma
privatização, sobretudo se for uma empresa rentista de um monopólio, mas isso
vai rareando e é preciso muitos amigos muito amigos. A TAP está uma maçada, os
transportes de Lisboa e Porto uma arrelia. Não se meta nisso para já, vá pelo
seguro, o débito que é crédito é o melhor, garanto-lhe.
Recomece sempre. A vida é uma aventura, viver não custa,
o que custa é saber viver. E não se esqueça, não dê entrevistas enquanto o
problema está quente, fala-se demais nesses dias, mas, mal passar a excitação
dos plebeus, pode voltar a aconselhar as autoridades sobre as medidas para
reforçar a credibilidade da economia. Bonomia, boa disposição, é isso que vale
milhões e recomece sempre.»
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