“Este tribunal não só acabaria por dar razão à juíza Grácio Alves, como criaria uma nova situação que, embora legal, não deixava de ser altamente polémica e bizarra. Aceitaria a separação de processos da acusação comum, permitindo ao alegado «corrupto» um julgamento separado do dos seus alegados «corruptores». Mecanismo de duvidosa democraticidade, utilizado em certos países subdesenvolvidos para «proteger » ministros e «castigar» a arraia miúda, sobretudo a que tem o descaramento de enfrentar o poder, é utilizado no nosso país para permitir que detentores de cargos políticos acusados possam ser julgados com celeridade. Com a justificação de que a Justiça é lenta. Acontece que este mecanismo é uma verdadeira aberração, uma vez que quando os detentores de cargos políticos são acusados têm a obrigação moral de se demitirem deixando, portanto, de exercer funções públicas. Por uma razão muito simples: para poderem ser julgados em igualdade de circunstâncias com os restantes cidadãos e não poderem haver dúvidas em ninguém de que utilizam imunidades e poder enquanto arguidos. Aliás, Carlos Melancia já não era detentor de nenhum cargo político e tão-pouco parece que o seu processo tenha sido apressado pelo benefício daquele mecanismo. Porque é que então lhe foi concedido o benefício de ser julgado separadamente e ver o seu
caso apreciado por juízes diferentes dos que apreciariam o caso dos outros?”
Contos proibidos, por Rui Mateus – Publicações D. Quixote lda, 1996, pp350-351
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