terça-feira, 9 de julho de 2013

Contos proibidos (46)

“Mário Soares telefonar-me-ia então convidando-me a mim e a minha mulher para almoçar na sua casa do Algarve no domingo dia 26 de Junho. Disse-lhe que considerava que o que ele me tinha feito era inqualificável e que revelava as suas duas faces: a do Mário Soares afável, solidário e generoso e a outra, a do arrogante, egocêntrico e autoritário. O primeiro, quando atravessa momentos de dificuldade, é capaz de todos os actos de charme e contorcionismo para conseguir apoios para um determinado objectivo e o segundo, quando sente ter conseguido esse objectivo e o poder na mão, tenta sempre apagar da história os que o ajudaram a conquistar posições de relevo. (...) Eu nunca lhe pedira para ir para o Governo, embora do ponto de vista curricular e partidário tivesse tanto direito a poder ambicionar ser ministro como ele próprio e talvez até mais do que muitos outros que foram ministros e cuja escolha se baseara unicamente em critérios exclusivamente seus. Que aliás frequentemente se comprovaram ter sido errados em muitos casos, a começar pela sua própria autodesignação de primeiro-ministro, em três infelizes ocasiões. O almoço acabaria mal e eu, que decidira pedir a demissão da Comissão Permanente disse-lhe isso mesmo: que após um período de reflexão decidira pedir a minha demissão, mas que em virtude da persistência da sua arrogante atitude que me magoara profundamente o não faria. Ele que me demitisse quando quisesse pois que, para mim, o PS não passava de uma «empresa» dele.

Contos proibidos, por Rui Mateus – Publicações D. Quixote lda, 1996, pp237-238.

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